Samba do rato doido

Samba do rato doido

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"Reis e Ratos" parece ter um futuro promissor logo em sua cena inicial, quando dois irmãos meio matutos estão levando uma cantora famosa para se apresentar numa gincana em uma pequena cidadezinha do interior do Rio de Janeiro no início dos anos 1960. Minutos depois de eles chegarem ao local, vai tudo pelos ares. Corta. A bomba, pensa-se, seria obra dos comunistas. Mas não, na realidade era uma tentativa de um grupo de golpistas de eliminar a cantora, amante do presidente da República. E neste começo morre qualquer outra tentativa de o filme "Reis e Ratos", de Mauro Lima, ter algo a dizer. Lima dirigiu "Meu Nome Não É Johnny", que também teve dois dos atores de "Reis e Ratos", Selton Mello e Rafaela Mandell, a cantora e namorada do diretor na vida real.
A trama é interessante. O braço da CIA no Brasil, cujo agente é Troy Summerset (Selton Mello), que trabalha no Rio de Janeiro sob o disfarce de um dono de uma sapataria, planeja derrubar o presidente da República, que estaria levando o Brasil aos braços do comunismo. Troy se une ao Major Esdras (Octávio Müller). Os três alcançam enorme sintonia, têm diálogos hilários, rápidos e rasteiros, e mais acentuados ainda por aquela voz meio anasalada de Mello, um americano sem nenhum sotaque.
Mauro Lima tenta recriar o clima daquela época. Até consegue, através de uma cuidada reconstituição de época e belas imagens em preto e branco durante boa parte do filme, devido a um flash-back de Troy. E personagens interessantes, como a sedutora cantora Amélia (Rafaela Mandelli) e seu acentuado sotaque sulista, ou o sebento Roni Rato (Rodrigo Santoro, irreconhecível e totalmente despojado de glamour graças a uma forte maquiagem), e até mesmo o efeminado radialista Hervê (Cauã Reymond), que tem o poder de prever o futuro, mas que inexplicavelmente vira uma espécie de ninja a certa altura do filme.
Então qual seria o problema de "Reis e Ratos?" O problema está no roteiro, confuso, tentando pegar carona nos filmes de espionagem da época da Guerra Fria, sem sucesso. Em determinado momento, Mauro Lima não consegue mais explicar nada, transformando "Reis e Ratos" num verdadeiro, como se diria à época, samba do crioulo-doido. Bem que no final todo mundo sabe no que deu. Os golpistas, não os atrapalhados deste filme, conseguiram o sucesso, derrubaram Jango e o Brasil se viu durante um período de trevas de 25 anos.


Por Chico Izidro

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