Alex Gonçalves: Na Indonésia, impedido de sair

Alex Gonçalves: Na Indonésia, impedido de sair

Giullia Piaia

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Baiano de coração gaúcho, Alex dos Santos Gonçalves foi revelado na base do Grêmio. O atacante teve passagens por diversos clubes no Brasil e no exterior, mas, no final de 2021, enfrentou situação delicada. Alex, que estava jogando na Indonésia, foi processado pelo seu ex-clube, o Persikabo 1973 (também da Indonésia), por difamação após ele ter entrado com uma ação na Fifa que condenou o time a pagar 60 mil dólares, cerca de 340 mil reais, ao jogador. Ele então ficou impedido de sair do país. Só conseguiu voltar ao Brasil depois que o presidente do Persikabo, Bimo Wirjasoekarta, assinou um documento de permissão de saída. O jogador chegou ao Brasil no dia 28 de dezembro de 2021.

Como você chegou à Indonésia?

Em 2019, eu estava jogando o campeonato paulista e recebi uma proposta de um empresário da Indonésia, um empresário local. Logo que acabou o campeonato paulista, aceitei a proposta e fui para o meu primeiro clube na Indonésia, o Persela Lamongan. Meu primeiro ano lá foi muito bom, fiz bastantes gols. Logo no início de 2020, fui contratado para jogar no Persikabo, que foi o time no qual tive todo o problema.

Você sabia algo sobre o país antes de ir para lá?

Fui procurar saber quando eu estava para assinar o contrato, em 2019, com um amigo que já tinha jogado na Indonésia. Então eram muito poucas as informações que eu tinha. Até porque não era um mercado que eu tinha até então na minha carreira, o mercado asiático.

Seus companheiros de equipe também tiveram problemas com o time?

Não, foi algo que aconteceu só comigo. Foi um fato isolado. O Persikabo é um clube militar, onde o presidente tem muita influência na polícia do país. Nenhum jogador, que eu saiba, teve um problema desse tipo.

Como que esses problemas começaram?

Em 2020, assinei o contrato com o Persikabo de janeiro a dezembro. Em janeiro e fevereiro recebi meu salário cheio. Chegou a pandemia e eles cortaram meu salário em 75% sem fazer qualquer tipo de acordo, nada. Não me chamaram para conversar. Então, em 2021, eu acertei com um time da Malásia por seis meses e fui para lá. Depois, voltei para a Indonésia, foi quando acionei a Fifa, que é quem zela pelos contratos de profissionais estrangeiros. Quando um clube não cumpre o contrato, não paga os vencimentos, você tem a quem recorrer e no caso dos estrangeiros é a Fifa. Eu recorri à Fifa pelos meus direitos e ganhei. Por eu ter colocado eles na Fifa, se criou essa situação, eles usaram da Covid para cortar meus vencimentos, mas sem falar comigo. Se tivessem feito um acordo antes, talvez eu até aceitasse. Mas não houve nenhum diálogo.

Quem mais o ajudou durante esse período?

O meu advogado, o português Pedro Macieirinha, juridicamente, ele me passou tudo o que eu tinha que fazer ou não. Mas assim, o apoio total foi da minha esposa e do meu filho, que, mesmo eu estando distante deles, estavam sempre apoiando e me dando forças. E, lá na Indonésia, quem me ajudou muito foi um empresário chamado Antônio Teles. Ele é um brasileiro que jogou por muitos anos na Indonésia e acabou se tornando empresário. Sou muito grato a ele.

Como foi o tempo que você teve que passar isolado no apartamento?

Foi uma loucura. Como o Persikabo ficava na cidade vizinha da qual eu morava e o presidente do clube era militar, eu tinha medo de sair na rua. Talvez até alguma coisa poderia acontecer com a minha vida. Então, fiquei recluso no meu apartamento, assustado. As vezes que eu tinha que sair, saía escondido, para tentar resolver a situação. Meu medo real era de algo acontecer comigo na rua. A vida que eu tinha antes, de ir em restaurante, shopping, foi interrompida por um momento, até eu sair do país. Como o presidente tinha muita influência no país, influência na polícia, meu medo era acontecer alguma coisa comigo, alguém me parar e fazer algo contra a minha vida. Então, não tinha muito o que fazer, era mais ficar no apartamento e ficar esperando, falando com os amigos e com a família no telefone. O que eu sabia fazer de comida, alguma coisa rápida, simples, eu fazia, mas a maioria das vezes eu pedia comida por aplicativo. Quando estava vivendo uma vida normal, eu ia no restaurante, comia no shopping. Mas eu pedia, eles deixavam a comida na recepção, eu descia para pegar a comida e já voltava para o meu apartamento.

Como se deu a resolução do problema?

Como meu caso deu muita repercussão aqui no Brasil, o presidente Bolsonaro fez uma pressão para me ajudarem, então o pessoal lá da embaixada meio que tomou um sacode e me ajudou. Eu tive que fazer um acordo com o Persikabo para poder sair da Indonésia. Tive que abrir mão de uma parte do dinheiro que me deviam, mas meu advogado está tomando conta disso. Está vendo o que vai fazer. Tive que abrir mão, senão estaria lá até hoje. O presidente Bolsonaro me ligou, ele me falou que a intenção dele era me tirar da Indonésia sem que eu precisasse fazer o acordo, mas que estava quase impossível. Eu queria agradecer a todas as pessoas que oraram por mim, que de alguma forma me ajudaram. O Dunga me ajudou muito, o Tinga, o Romário, que postaram nas redes sociais deles. Inúmeras pessoas. Só tenho a agradecer. Deixo minha gratidão e espero que Deus possa abençoar o caminho de cada uma delas.

Qual a primeira coisa que você fez ao voltar ao Brasil?

Quando cheguei em São Paulo, a primeira coisa que eu fiz, no aeroporto, foi comer uma coxinha. Quando cheguei em casa, em Porto Alegre, era meia-noite. Com a minha família reunida, a gente fez um chimarrão, fizemos uma roda e comecei a contar tudo que eu tinha passado, tudo que aconteceu comigo realmente. Eu estava com muita saudades de tomar um “chimas”, então essa foi a primeira coisa que fiz com minha família. Eu estava há um ano e meio sem voltar para casa.

Quais seus próximos passos no futebol? Pretende voltar para o exterior?

Já joguei na Turquia, em Portugal, na Romênia, na Ásia. Meu pensamento ainda é de voltar para o exterior. Mas também estaria disposto a ficar no Brasil, se receber alguma proposta para ficar aqui. Eu quero jogar, tenho 31 anos e ainda tenho tempo para isso. É a única profissão que eu sei fazer e que gosto de fazer. Espero que Deus possa abrir uma porta rápido para mim.

Qual jogador o inspira?

O Ronaldo Fenômeno. Eu acordava de madrugada para ver os jogos da Seleção em 2002. Ele foi e é minha inspiração. Ele é um cara que eu me espelho muito, até por jogarmos na mesma posição.


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