O diálogo como ferramenta

O diálogo como ferramenta

Empossado como procurador-geral de Justiça do Ministério Público do RS, Alexandre Saltz afirma que as modificações que pretende realizar no órgão – e para as quais acredita ter sido escolhido – já estão sendo postas em prática nesses primeiros meses de atuação. À frente do MPRS no biênio 2023-2025, ele se apresenta como um defensor dos vulneráveis, destacando que seu mandato será voltado, principalmente, à proteção das vítimas, ao combate à violência contra as mulheres, à educação e à garantia de outros direitos constitucionais em setores como meio ambiente, do consumidor e proteção dos idosos. O diálogo será uma das marcas de sua gestão, afirma o novo procurador-geral de Justiça do MPRS.

Kyane Sutelo

publicidade

Na campanha, o senhor falou que o Ministério Público do RS poderia ser “muito mais efetivo”. De que forma pretende fazê-lo?

Nós já estamos fazendo. Primeiro, tendo prioridades de atuação, elegendo áreas em que nós vamos atuar, e já elegemos. Vamos atuar muito na proteção das vítimas, da violência contra as mulheres, na proteção dos vulneráveis. Vamos investir muito na educação, na proteção dos direitos previstos pela Constituição, como o meio ambiente, o consumidor, a proteção do idoso, dos vulneráveis de uma maneira geral. Já estamos tomando medidas administrativas para colocar esse nosso projeto em marcha e algumas medidas já são perceptíveis. Por exemplo, a reorganização dos Gaecos (Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), a criação de um centro de apoio específico para as promotorias do júri, a criação de um centro de apoio específico para violência doméstica e a redesignação de um centro de apoio para a educação.

O senhor tem experiências no interior do Estado. Como pretende aproximar o diálogo com as comarcas mais distantes? 

Sabendo que cada região do Estado tem uma peculiaridade. Isso já é um olhar diferenciado, porque já nos desafia a ter políticas específicas para determinadas áreas. Eu sou natural de Uruguaiana, fui promotor lá por quase 14 anos. Mas, acima de tudo, o fato de eu estar na execução até uns dias me mostra essa necessidade de a gente ter olhares diferentes para problemas que estruturalmente podem parecer iguais, mas atingem a demandas que são diferentes, a pessoas que pensam de maneira diferente e com realidades sociopolítica e econômicas completamente diferentes. Então, a gente tem que fazer esse ajuste. Mas isso também tem que ser interpretado pelo Ministério Público como mais uma necessidade de aproximação da sociedade porque quem vai nos dizer como essa prestação de serviço tem que acontecer é a sociedade.

Como fazer a sociedade entender qual é o papel do MP e como e quando pode acessá-lo?

Esse é o desafio da nossa Comunicação, que a sociedade reconheça o valor da instituição. Talvez simplificar um pouco, fugir do linguajar jurídico, conversar mais diretamente com as pessoas, utilizar muito as redes sociais, que hoje são grandes ferramentas de comunicação. Mas também ouvir as pessoas. E nós vamos ter, logo adiante, um projeto para que as pessoas respondam o que elas esperam do Ministério Público. Eu sempre fui uma pessoa de muito diálogo, muito aberto, bastante empático e com nenhum compromisso com erro. Então, se alguma decisão que for tomada não for a melhor, a gente vai corrigir e vai buscar sempre o melhor caminho, sempre acertar, porque nós somos servidores públicos.

Quais os maiores desafios que lhe trouxeram até o momento?

O maior desafio hoje, em geral, é a recomposição da mão de obra do MP. É um desafio do Estado inteiro. São 242 cargos vagas e mais quase 400 servidores. Isso é 1/3 da nossa mão de obra e nós precisamos recuperar, porque, especialmente nas comarcas de entrância inicial, que são aquelas cidades menores, hoje são 74 promotorias que estão sem promotores titulares. Tem um promotor que substitui, mas ele não está ali sempre, não está vivendo a vida daquela comunidade. É muito complicado ter uma cidade que não tem um promotor de Justiça.

É possível realizar um concurso público neste ano?

Vamos ter que fazer, mas vamos ter que dialogar com a sociedade, com o poder político, com a Assembleia Legislativa, porque o orçamento do Ministério Público tem que ser revisto, mesmo com regime de recuperação fiscal, que nós sabemos que é necessário. Mas a sociedade precisa da proteção que o Ministério Público traz e que essa proteção possa continuar sendo prestada como ela sempre foi. Ainda está sendo, só que agora com muito esforço. Nós temos colegas que estão adoecendo, jovens que estão infartando, tendo AVCs, pelo volume de trabalho a que estão submetidos. A gente precisa que a sociedade entenda isso. Que se reconheça o valor da instituição e, de alguma maneira, proporcione uma melhoria da condição de trabalho, que passa, obrigatoriamente, pelo preenchimento desses cargos que estão vagos. E, para que isso aconteça, tem que haver incremento orçamentário. É preciso de um grande diálogo político que nós já começamos.

Como avançar no combate á violência doméstica e em outros temas com desafios orçamentários? 

Primeiro é preciso ter prioridades. Segundo, é ser criativo. E terceiro, é saber o que tem que ser feito. E nós sabemos. Então, reorganizamos os chamados grupos de proteção às vítimas de violência doméstica, os Gepevids, passamos de 9 para 12. Temos 12 regiões do Estado em que vai ter lá um promotor de Justiça designado para formar as redes de proteção e acolhimento para as mulheres. E não só isso, também outras iniciativas como trazer os homens para aquele círculos restaurativos, porque o objetivo da lei é proteger a mulher vítima de violência, mas o homem agressor precisa ser tratado também, porque senão ele vai continuar aquele ciclo de violência contra outras vítimas. Outro projeto é o MP na estrada, em que nós vamos andar o estado inteiro para discutir, porque a questão da violência contra a mulher também tem peculiaridades regionais e tu não consegues ter uma abordagem geral para um problema que varia de região para região. Isso também já é uma nova forma de enfrentar o problema. E aí já tem a questão da proteção à vítima. O Ministério Público vai ser uma grande instituição de acolhimento das vítimas. O MP é o advogado da vítima no processo e o que queremos é que a vítima deixe de ser o objeto do processo e passe a ser um sujeito. Que ela passe a ter voz e vez no processo e esse papel é do MP: defendê-la e demonstrar quais são os direitos que ela tem. A mudança (nos centros de apoio) não é só uma mudança de nome, não é uma mudança cosmética, é uma mudança de paradigma.


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895