Sobre o uso de IA na educação

Sobre o uso de IA na educação

Quem segue Martha Gabriel nas redes sociais, principalmente no Instagram, já tem uma noção daquilo que será tendência em um futuro próximo ou mesmo dos mais diferentes dados relacionados ao comportamento do brasileiro na Internet e no mercado de trabalho.

Rodrigo Thiel

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Há alguns anos, víamos a Internet como desafio para a educação, hoje são as inteligências artificiais (IA’s). Como a senhora vê as IA’s no dia a dia da educação?

Da mesma forma que a Internet foi desafio e depois virou parte da educação. Foi assim também muito antes da internet, com a calculadora. Foi assim também depois da internet, com os buscadores, a discussão de se podia usar numa sala de aula, depois os telefones celulares. Então, o que a gente aprendeu é que quando vem uma nova tecnologia, especialmente quando ela está acessível para os jovens, para os estudantes, independente do ambiente, do contexto escolar, a única forma de lidar com ela é abraçando. Então, a educação tem que abraçar a IA em todas as suas dimensões. E isso é uma coisa boa. O problema é o ritmo de mudança necessário para que você consiga utilizar a inteligência artificial de maneira adequada na educação. E eu digo isso para os professores prepararem planos de aula ou para as aulas em si. As dinâmicas têm que serem diferentes quando a gente tem uma tecnologia inteligente junto. Então, por exemplo, em vez de você fazer uma pergunta para um aluno criar um trabalho que pode ser feito pelo ChatGPT ou outra IA qualquer, as perguntas têm que ser feitas para ele analisar o trabalho do ChatGPT. Para ele fazer pergunta para o ChatGPT, para fazer a análise comparativa entre os vários tipos de respostas que a IA e os outros alunos estão dando também. Então, isso não só é importante no cenário de novas tecnologias inteligentes, como isso também ajuda ao desenvolvimento das habilidades necessárias para esse cenário, que é o pensamento crítico, a criatividade. Então, a educação precisa se apropriar. Porque não tem outro caminho para que você possa dar os próximos passos. Negar só vai fazer perder tempo. Ficar atrasado. Muitas dessas tecnologias trazem problemas de privacidade se não souber utilizar, compartilhamento de dados de forma inadequada. Então, para evitar qualquer risco, a gente tem que ter um letramento adequado, conforme a tecnologia vai entrando.

Quais são as principais oportunidades que as tecnologias oferecem para a educação?

Toda a tecnologia amplia a gente. O carro amplia o nosso movimento. Óculos, binóculos, telescópio e microscópio ampliam a nossa visão. Quando a tecnologia chega na educação, ela tem uma oportunidade gigante de ampliar a educação em todas as suas dimensões. Ela pode ajudar a ampliar o pensamento crítico se você usar as dinâmicas adequadas. A tecnologia não só traz muito mais informação para ser combinada, como ajuda a combinar. E a gente combina isso e complementa com a nossa criatividade, que é mais intencional, mais direcionada, mais contextual. Um exemplo que dou também, só com o ChatGPT, não precisa nem falar das outras IA’s que a gente tem por aí, você consegue entrevistar qualquer personagem histórico e perguntar coisas para ele dentro do contexto que ele vivia naquela época. Isso é uma riqueza enorme. É comparar pensamentos de autores diferentes, de linhas diferentes de argumentação. Qualquer atividade hoje de educação e de aprendizagem se beneficia do uso da inteligência artificial.

Sabemos que muitas das profissões do futuro sequer existem ainda. A criação e o desenvolvimento delas passam pela aplicação de tecnologias emergentes na educação?

Tem duas coisas diferentes aqui. Tem muita profissão no futuro que a gente realmente não conhece, mas essas profissões surgem não em função da tecnologia, mas das mudanças que a tecnologia causa no mundo. Então, eventualmente, porque a gente teve carros no mundo, a gente começou a precisar de mecânico de carro, que era uma profissão que não existia. Então, quando a gente fala disso, é mais importante na educação usar as tecnologias para a gente melhorar as competências e as profissões e as habilidades que a gente faz hoje. Eu brinco que o que a gente fala, na realidade, não tem que ser sobre novas profissões, mas sobre novos profissionais, como eu uso a tecnologia para ir me transformando para o que for necessário na minha profissão, na minha área. Conforme essa tecnologia vai evoluindo, vão surgindo outras profissões e outras oportunidades.

O que falta na rede de ensino para uma verdadeira aplicação da Educação 5.0?

Para a gente pensar em uma educação do futuro, que acho que é o que a gente está buscando, há um processo contínuo de estado de preparo para atuar no presente, mas continuar sendo relevante no futuro. A educação no Brasil e no mundo precisa de várias transformações. A primeira delas começa no currículo. A gente precisa ter mais disciplinas e mais metodologias que favoreçam as habilidades para o futuro, que são pensamento crítico, criatividade, adaptabilidade, colaboração, humanidade e várias outras. Mas, além disso, a escola tem que propiciar um ambiente educacional que vá além da sala de aula, que comece antes e depois. Que integre com tudo que tem no mundo. Então, junto com o ambiente escolar, a gente precisa de infraestrutura, conexão, tecnologia e sistemas que favoreçam o relacionamento entre os seres da comunidade educacional de forma a criar uma sinergia para que essas habilidades se desenvolvam. Então, se formos pensar no que a gente tem hoje e o que a gente precisa, precisamos de uma mudança de currículo. E tecnologia que continuamente esteja disponível para criar esse ambiente de aprendizagem. Agora, a questão é de a gente dar os próximos passos. Não tanto nas metodologias, mas nos conteúdos, nas habilidades que a gente precisa ter como professor e o apoio de infraestrutura que a escola precisa ter com os outros ambientes. Um exemplo disso foi a pandemia. A pandemia colocou todo mundo online de uma maneira não preparada. Não é só ter tecnologia e a pandemia foi a prova disso. A gente não nasceu para ser online 100%, mas quando a pandemia foi embora, muitas das instituições voltaram a ser 100% presencial. Quase despreza a possibilidade de continuar utilizando as ferramentas de participação remota. Lógico que as ferramentas têm que ser cada vez mais inclusivas, mas tem que incluir isso no nosso dia a dia, porque isso faz parte do ambiente onde as crianças menores, especialmente, estão chegando. Elas experimentam isso o tempo todo. Então, esse processo falta e ele pode ser feito de forma gradativa, com um pouquinho mais de liberdade, com grandes direcionamentos didáticos, educacionais, para que essas outras peças se encaixem na estratégia.


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