Uma voz contra a gordofobia

Uma voz contra a gordofobia

Por Rafael Rangel Winch

Rafael Rangel Winch

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Uma das principais figuras do Carnaval, o Rei Momo é um personagem histórico na mitologia grega que se tornou sucesso na folia brasileira. Em Porto Alegre, quem ocupa o posto é Luiz Pablo Gawlinski, 32 anos. Conhecido como Japa, ele compõe a Corte do Carnaval. Morador do Passo das Pedras, concilia as atividades da folia com outras duas funções em uma serralheria: soldador e segurança do trabalho. O Rei Momo de Porto Alegre é pai de Laura, 11 anos, e Vicente, 7 anos, e apaixonado por fotografia. Em conversa com o Correio do Povo, ele fala, entre outros assuntos, sobre os investimentos públicos no Carnaval e revela seus objetivos para além da folia, incluindo um projeto para empoderar pessoas gordas.

Como funciona o processo para se tornar Rei Momo?

Eu nunca imaginei ser o Rei Momo. Eu trabalho no Carnaval desde 2009, mas até então era em barracões e ateliês, departamentos da folia. No Carnaval passado, estava fazendo fotos em uma avenida e me viram. Assim que passou o Carnaval, me fizeram o convite para assumir o cargo de Rei Momo. Na hora, de brincadeira eu falei, “tá bem, aceito”. No começo achei que era brincadeira porque eu tenho um lado muito tímido. Só que era algo sério mesmo. A partir daí, estudei o que um Rei Momo faz. O convite partiu do presidente da União da Vila do IAPI, Jorge Sodré. 

Quais são as principais atribuições que o cargo exige?

O Rei Momo deve levar o nome do Carnaval em todos os locais que passar, convidar e mostrar nossa cultura em outros lugares e meios a que o Carnaval não chega. É ser o representante de todas as escolas e de todos os nichos do Carnaval, dos aderecistas aos destaques, é brigar politicamente pelo nosso carnaval. É se fazer presente junto à Secretaria de Cultura, sempre buscando melhorias para o nosso Carnaval. Antigamente o Rei Momo era o folião da festa. Hoje também tem um papel político. Ele tem que levar a comunidade ao lugar de fala, adentrando na prefeitura, especialmente na Secretaria de Cultura. É preciso estar à par de tudo o que a gestão municipal vem fazendo em prol do Carnaval.

Muitas pessoas entram na folia desde a infância. Em que momento o Carnaval entra na sua vida?

Cheguei no Carnaval tarde. Minha infância não foi na folia. Vim para o Carnaval através de um relacionamento. A primeira escola em que eu pisei foi a União da Vila do IAPI. A partir de então, comecei a frequentar os ensaios. No mesmo ano, saí em alas, em carros, depois comecei a trabalhar em barracões. Também estudei para ser jurado de mestre-sala e porta-bandeira. Já fui do departamento de Carnaval, de destaque. Depois disso tudo, o Carnaval não saiu mais da minha vida. Hoje, pra mim, o Carnaval representa a emoção. Emoção que contagia o meu filho, que é mestre-sala. Emoção que está dentro da minha casa. É o lado mais forte pra mim.

O Carnaval é reconhecido por ser uma festa que preza pela diversidade e inclusão. Como a folia de Porto Alegre pode se tornar uma festa ainda mais valorizada, acessível e democrática?

Neste ano está nítida a valorização da prefeitura e da Secretaria de Cultura com o nosso Carnaval. É um ano em que a acessibilidade está em alta devido ao retorno das arquibancadas gratuitas depois de 10 anos. E lembrando que esse foi o pedido do prefeito da cidade. Também acho que, para a festa daqui ser mais democrática e valorizada, seria necessário cuidar da estrutura física da nossa casa, o Sambódromo. Mas pelo que vi já estão encaminhando discussões para que isso aconteça.

Como está sua expectativa para os desfiles das escolas de samba que acontecerão na primeira semana de março aqui na Capital?

Muito grande porque será a primeira vez que vou pisar como Rei Momo na Avenida. Como a gente vem visitando as escolas e têm um trabalho junto aos barracões, posso dizer que será a volta do Ouro do Carnaval. Haverá carros alegóricos gigantescos. Tem toda uma cadeia produtiva do Carnaval em si. Será um carnaval de muita alegria. A expectativa está a mil.

De que maneira o senhor avalia o incentivo do poder público de Porto Alegre em relação ao Carnaval?

O incentivo é de milhões. A Secretaria de Cultura, na qual a gente pode estar mais presente, junto com o prefeito Sebastião Melo, está apoiando nosso Carnaval. O secretário de Cultura, Henry Ventura, tem apoiado muito a gente.

O senhor torce por alguma escola de samba aqui da Capital?

Depois que a gente vira Rei Momo, torcemos para o Carnaval inteiro. Não podemos declarar uma torcida, mas há, sim, escolas por quem o coração bate mais forte.

Sabemos que outras capitais, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo, possuem uma tradição com desfiles de escolas de samba. Alguma agremiação de fora agrada você?

Sobre as de lá eu posso falar (risos). Das escolas de São Paulo, eu torço muito para a Águia de Ouro e, das do Rio de Janeiro, eu torço muito pela Mangueira. É emoção pura. É comunidade.

Quem é a pessoa por trás da fantasia de Rei Momo?

É uma pessoa que tem a aparência de forte, mas, no fundo, é muito emotiva. É difícil falar de si, é uma emoção forte que sinto fazendo isso. Tento trazer toda a força que eu tinha da minha mãe, que veio a falecer de Covid. Então, tudo o que faço é tentando fazer o que daria orgulho a ela. Sempre é a emoção que me move.

Seu apelido é Japa. De onde ele surgiu?

Fui Mister Brasil Plussize Virtual 2018. Isso abriu portas e acabei me tornando modelo, mas, devido à falta de profissionais que soubessem trabalhar com pessoas gordas, veio a vontade de aprender e estudar para trabalhar melhor com o público plussize. Nesta mesma época, pediram um nome artístico. Pela questão de eu ter o olho puxado, surgiu o apelido Japa Gawlinski. 

Sendo agora membro da corte carnavalesca de Porto Alegre, como ficou a sua rotina de trabalho?

Sou segurança do trabalho, então pego no emprego das 8h às 18h. Depois desse horário viro Rei Momo. Atualmente, visito todas as escolas, comunidades até a madrugada.

No que se refere a lugares e eventos, o que mais gosta de fazer em Porto Alegre?

Como bom gaúcho, tomar um chimarrão na Orla do Guaíba e ver o pôr do sol mais lindo do Brasil. Também gosto de curtir a Cidade Baixa porque lá ficam os melhores pubs da nossa cidade. Curto ir ao cinema assistir às estreias de alguns filmes. Além disso, gosto de levar meus filhos na Redenção para andar de bicicleta e soltar as energias acumuladas (risos).


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