Grêmio: movimento quer adiar votação da permuta do CT Cristal

Grêmio: movimento quer adiar votação da permuta do CT Cristal

"Após o pagamento de R$15 milhões, por parte da Multiplan, que administrará o parque público a ser construído na área permutável do CT Cristal, quando as obras serão iniciadas? Imediatamente?"

Hiltor Mombach

CT Cristal instalou grama sintética em um dos campos em 2020

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PERMUTA DO CT CRISTAL: ADIAR POR RESPONSABILIDADE AO PATRIMÔNIO DO GRÊMIO

Diante das informações públicas e daquilo que foi buscado, inclusive em diálogos institucionais, sobre o assunto de uma possível permuta de aproximadamente 63% da área construída do CT Cristal (3,4 hectares), área pertencente ao Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense desde 1972, então conquistada pelas Leis Municipais de Porto Alegre nº 3.653/72 e nº 7.018/91, onde historicamente funciona a Escola do Clube, por um terreno público de 10 hectares localizado ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho, e diante do Edital de Convocação do Conselho Deliberativo para discutir pela primeira vez e deliberar sobre este assunto no próximo dia 28 de novembro, o Movimento Grêmio de Todos vem manifestar a seguinte posição:

Inicialmente, cumpre dizer que a negociação em si aparenta ser benéfica para o GRÊMIO. Primeiro porque o Clube garante a sua continuidade na área do CT Cristal, sendo importante manter a bandeira tricolor em espaço nobre da Capital gaúcha. Segundo porque o GRÊMIO receberia valores relevantes (R$15 milhões para investimentos patrimoniais + R$ 5 milhões em obras no CT Cristal) e um terreno ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho, projetando-se uma ampliação deste. Na prática, a permuta também seria muito boa para a Prefeitura de Porto Alegre, que teria um acréscimo na Orla do Guaíba, e para a construtora envolvida, a Multiplan, pois esta evitaria uma construção vertical a prejudicar a “vista” de seus empreendimentos próximos ao local. Porém, antes de tudo, o negócio precisa ser bom e seguro para o GRÊMIO. Por isso, vale lembrar que as aparências podem enganar. 

Entende-se, primordialmente, que o debate sobre o negócio ser bom ou não para o Clube passa neste momento, ante o edital convocatório do Conselho Deliberativo, estritamente pelos questionamentos acerca da insegurança patrimonial da negociação, bem como acerca do problema do açodamento do debate. A pressa costuma ser inimiga da perfeição. Infelizmente, o histórico do GRÊMIO em debater e deliberar sobre seu patrimônio a toque de caixa não é positivo, vide o caso da Arena.
E aqui reside o primeiro questionamento: se o tema está na rotina administrativa do Clube há tanto tempo (desde 2019), por que será debatido pela primeira vez no Conselho Deliberativo justamente no dia de sua votação? Por que o atual Conselho de Administração segurou a proposta da negociação de 19 de maio deste ano até agora, sem que tivesse qualquer mudança nela durante todo este período?
Por que deixar para as últimas sessões do Conselho Deliberativo? Por que não ter enviado, com devido prazo responsável, a minuta contratual para a Comissão de Patrimônio e outras comissões competentes do Clube, a fim de que realizassem um estudo detalhado e emitissem um parecer com a calma e a serenidade tão necessárias diante de um assunto desta magnitude, por quê?

Na mesma esteira, questiona-se o argumento jurídico de que, se o GRÊMIO não aprovar neste ano, não terá como a negociação acontecer no próximo ano em virtude das vedações legais em ano eleitoral. Isso não procede!
Pois, o negócio em questão trata, simultaneamente, de uma doação onerosa do Governo do Estado do Rio Grande do Sul para a Prefeitura de Porto Alegre, autorizada por Lei desde 2019 (Lei Estadual nº 15.432/2019), e de uma permuta de terrenos e valores entre o GRÊMIO e a Prefeitura de Porto Alegre, que teria a participação da construtora Multiplan como viabilizadora negocial.
Isto é, não se trata em nenhum momento de “distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública”, então vedação legal prevista no artigo 73, parágrafo décimo, da Lei das Eleições (Lei Federal nº 9.504/1997).

Ademais, tem-se uma vasta compreensão jurídica nesse sentido, bastando recordar da recente previsão do artigo 81-A da Lei de Diretrizes Orçamentárias, de 2022, da União, que expressamente permitiu doação onerosa em ano eleitoral.
Mais que isso, cuidando especificamente do Estado do Rio Grande do Sul, a Procuradoria-Geral do Estado, em 2020, emitiu parecer favorável à doação onerosa de terrenos do Estado para o rival citadino do GRÊMIO. O parecer nº 18.066/20, constante no processo administrativo nº 19/0801-0000350-0, e a previsão do artigo 73, § 10, da Lei das Eleições, são elementos jurídicos suficientes para garantir de que, sim, o Estado poderá doar, de modo oneroso, certo terreno para a Prefeitura de Porto Alegre em ano eleitoral; e obviamente, com muito mais razão, a Prefeitura e sua parceira negocial, a construtora Multiplan, poderão realizar permuta de terrenos e valores com o GRÊMIO, a qualquer tempo, independentemente de ser ou não ano eleitoral.

Vencida a tese de que o GRÊMIO deve, a qualquer custo, deliberar sobre o negócio neste ano, ignorando que se trata de uma negociação complexa, passa-se a informar à Torcida Gremista sobre os riscos negociais.

O terreno de 10 hectares, localizado ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho, pertencente hoje ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul, que está autorizado a doar onerosamente para a Prefeitura de Porto Alegre, sendo objeto de possível permuta com o GRÊMIO por 3,4 hectares do CT Cristal, lamentavelmente, encontra-se com problemas ambientais e ocupado há mais de uma década por 54 famílias em condição de miserabilidade extrema. A maior parte destas famílias sobrevive da reciclagem, não querendo, por isso, sair daquele local que permite tal atividade.
E para além da questão social, há uma questão jurídica, pois a situação das famílias está judicializada (Processo nº 5053263-28.2022.8.21.0001) e com audiência de conciliação marcada para 2 de abril de 2024! Assim, chega a ser risível, e ao mesmo tempo triste, acreditar que o imbróglio socioeconômico e jurídico das famílias será resolvido até o final de 2024, conforme se extrai do inciso I, do artigo 2º, da Lei Estadual nº 15.342/2019, ora diploma legal que autorizou a doação onerosa do terreno do Estado do RS para a Prefeitura de Porto Alegre com esta e outras contrapartidas.
Aliás, a contrapartida da recuperação ambiental (despoluição) do terreno, antes de ser entregue ao GRÊMIO, igualmente será inviável de cumprimento antes da definição da situação das famílias que ocupam a área e sobrevivem da reciclagem.

Para piorar, até o presente momento, poucos documentos e informações essenciais para discussão e deliberação das comissões do GRÊMIO foram apresentados. E mesmo que sejam apresentados nos próximos dias, ainda assim, o tempo para análise será absurdamente precário.
Em verdade, diversas dúvidas ainda pairam no ar: 

- Como a Comissão Patrimonial poderá analisar uma minuta contratual complexa em pouquíssimos dias? E os conselheiros terão tempo hábil para ler a minuta? Depois de aprovado o projeto, caso tenha revisão (e certamente terá), a minuta voltará para apreciação definitiva do Conselho Deliberativo e de suas comissões? 

-Como ainda não foi apresentado o levantamento topográfico por georreferenciamento dos terrenos em questão? 

-Considerando a notória disparidade de valorização das áreas, como ainda não foi apresentada uma avaliação patrimonial (ou várias avaliações patrimoniais) dos terrenos que possivelmente serão permutados?

-Há plena noção sobre as possibilidades construtivas permitidas legalmente em ambas as áreas? O GRÊMIO poderá construir a “Cidade do Grêmio” no local ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho? O GRÊMIO avaliou a possibilidade de buscar aumento dos índices construtivos (coeficientes de aproveitamento) da área do CT Cristal, atuando em paralelo ao projeto de lei em tramitação na Câmara Municipal dos Vereadores de Porto Alegre que pode beneficiar o rival citadino?

-Por qual motivo o GRÊMIO não realizou um edital de chamamento público ou enviou carta-convite para grandes construtoras, a fim de receber outras propostas, talvez melhores, para negociar parte do CT Cristal, considerando a valorização da região, enfim, por qual motivo? O GRÊMIO chegou a estudar outras propostas alternativas de permuta patrimonial?

-Por que o GRÊMIO ainda não possui sequer um esboço de projeto sobre o que fazer com a área que possivelmente receberá? Será uma ampliação do CT Presidente Luiz Carvalho ou algo maior como a ideia de uma “Cidade do Grêmio”? Há noção plena sobre como conter o alagamento frequente daquela região em dias de chuva?

-Quais as garantias contábeis de que os R$15 milhões serão destinados somente para investimentos patrimoniais, não devendo ser utilizados em despesas correntes, quais as garantias? Esse dinheiro será usado antes da efetivação da permuta, isto é, antes de o GRÊMIO receber o terreno ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho totalmente livre das contrapartidas que serão assumidas pela Prefeitura de Porto Alegre e pela Multiplan?

-O Departamento de Responsabilidade Social do Clube realizou reuniões com as 54 famílias? Foi avaliado eventual impacto negativo na imagem do GRÊMIO em virtude de uma pressão pública pela remoção das famílias? O Departamento Jurídico do Clube realizou estudo sobre a ação judicial que trata do caso das famílias? O Departamento Jurídico do Clube sabe de um Inquérito Civil no Ministério Público do RS sobre o assunto? Há avaliação jurídica sobre o risco de eventuais ações populares e de outras medidas judiciais, por questões ambientais diversas, sobre o terreno ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho? 

-Para onde irão os mais de 200 alunos da Escola do GRÊMIO que serão perdidos com a redução dos campos? Como será este processo de desligamento das crianças? Por que os 2 campos do novo espaço serão de grama sintética? Por que não serem de gramado natural? Ainda que seja mais caro, vale o investimento. É a Escola do GRÊMIO! Qual impacto avaliado na captação e formação de alunos da Escola? Não seria possível ficar com 3 campos? O belo trabalho feito na Escola do GRÊMIO merece ser aperfeiçoado, e não prejudicado!

-Após o pagamento de R$15 milhões, por parte da Multiplan, que administrará o parque público a ser construído na área permutável do CT Cristal, quando as obras serão iniciadas? Imediatamente? O GRÊMIO permitirá as obras no CT Cristal antes de receber o terreno ao lado do CT Presidente Luiz Carvalho totalmente livre das contrapartidas da Prefeitura e da Multiplan? Ou o GRÊMIO permitirá obras no CT Cristal antes disso?

-Por todo o exposto, não há qualquer prejuízo ao GRÊMIO no adiamento da votação. A pressa não é do Clube. Ao contrário, prejuízo pode haver se a votação ocorrer sem o aprofundamento do debate acerca do assunto. A lembrança dos problemas ainda presentes da negociação complexa da Arena deve servir como sinal de alerta para a Torcida Gremista. Não se pretende ser caranguejo do progresso tricolor, porém, não se pode assinar um cheque em branco sobre o patrimônio do GRÊMIO. Assim, considerada a complexidade temática e a ausência de muitos documentos oficiais, as comissões do GRÊMIO não poderão emitir um parecer conclusivo e assertivo em tão pouco tempo. Portanto, mesmo não tendo conselheiros, o Movimento Grêmio de Todos espera que o Conselho Deliberativo, organismo competente para discutir e deliberar sobre o tema (artigo 65, inciso XVIII, combinado com o artigo 109, e parágrafos, todos do Estatuto Social do GRÊMIO), finalmente decida pelo adiamento responsável da votação. E em último caso, não sendo esta adiada, o Movimento Grêmio de Todos pede aos conselheiros para que votem contra o projeto, tendo em vista a insegurança da negociação.

-Mais do que isso, o Movimento Grêmio de Todos luta para que, em oportunidade futura, o Estatuto Social necessite ser reformado a fim de deixar, em última instância, a vontade do associado prevalecer sobre o patrimônio do GRÊMIO, pois o GRÊMIO deve ser verdadeiramente de Todos os Gremistas.

Porto Alegre, 22 de novembro de 2023.
Coordenação Ampliada do Movimento Grêmio de Todos


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