Um Brasil escandaloso

Um Brasil escandaloso

O meu Brasil, no seu Brasil, no Brasil dos mortais, salário é pago para trabalhar. Já o Brasil da grã-finagem é outro Brasil

Hiltor Mombach

Com alta de despesa, governo bloqueia R$ 1,72 bilhão do Orçamento

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Há muitos Brasis neste Brasil. O mais escandaloso é o Brasil dos nababos que passa o chapéu como quem mendiga na Rua da Praia. Estou falando dos jogadores de futebol. Aqui, abro um parêntese: dos grandes clubes.

O meu Brasil, no seu Brasil, no Brasil dos mortais, salário é pago para trabalhar. Já o Brasil da grã-finagem é outro Brasil.

Há jogadores ostentando um faturando superior a um milhão por mês. São R$ 12 milhões por ano. A cada dia pinga R$ 33 mil na conta. 

Já na conta do assalariado pinga menos da metade em 365 dias.

Nelson Rodrigues trata de Chacrinha em uma das suas crônicas. Lá pelas tantas, escreve o seguinte: “Passo finalmente ao Chacrinha. Disse eu, no início da presente confissão, que a sua barriga é uma paisagem. Mas o que me importa, mais do que essa plenitude do ventre, é o ordenado do Chacrinha. Já disse e aqui repito: seu ordenado deflagra, no momento, toda uma indignação nacional. Oitenta milhões por mês.”

Aqui a questão. Ao fabuloso ordenado de Chacrinha estava engatado ao rendimento que o célebre apresentador trazia para a televisão. Era remunerado com a evidente obrigação de ser um vencedor no auditório.

Agora chego ao assunto. O Brasil dos jogadores nababos dá prêmio para vencer. Sim, escandalosamente há incentivo para ganhar. 

O escândalo tem nome e sobrenome: bicho extra. Cometo aqui um exercício de raciocínio pueril: os salários, estratosféricos, não são pagos justamente para isto, para ganhar? 

Neste outro Brasil não há contrapartida. Um time que joga e perde como se estivesse chumbado ao gramado não vê descontado um mísero centavo. Diante dos holofotes, os jogadores desfilam a mesmice de sempre, aquele blá-blá-blá clichê, decorado: "O negócio é levantar a cabeça". 

A derrota, mesmo que humilhante, vem sem nenhum desconto financeiro. A maior punido é o torcedor, vexado, gozado, ridicularizado.

O leitor poderá cometer um reparo, dizer que percebe neste colunista mais do que indignação. Vê a inveja escancarada. Acertou na mosca. Meu Brasil é outro, se é que me faço entender.

Agora, o paradoxo. Este Brasil que distribui prêmios como se fosse um Onassis está quebrado desde os tempos jurássicos do futebol.

O governo criou dois programas para recuperar os bilhões devidos pelos clubes (INSS, Receita Federal FGTS...). Refis e Timemania pedalaram uma dívida em intermináveis 20 anos.

Carrasco com os simples mortais, o governo é uma generosa mãe brasileira para com os clubes. Compadecido com o filho grã-fino o governo pedala a gastança como se fosse um Lance Armstrong. É mais do que cúmplice, portando. É um dos financiadores deste Brasil perdulário.


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