A maldição do patronato da Feira de Porto Alegre

A maldição do patronato da Feira de Porto Alegre

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Eu sou maldito.

Maldito assumido, orgulhoso, quase arrogante.

Tudo contribui para aumentar a minha maldição.

Quando um maldito protesta, o público chama seu protesto de queixa.

Quando um maldito se queixa, o público fala em vexame.

Quando eu aceitava integrar a lista de patronáveis da Feira do Livro de Porto Alegre, era, como se diz na gíria do futebol, "corneteado" por nunca ser escolhido. Os inimigos me consolavam:

– Tu ainda vais ganhar.

Os amigos justificavam:

– Eles não te merecem.

Eu era o coitado ultrapassado por todo mundo. Motivo de chacota. Parecia que eu vivia só para tentar ser patrono, que eu não dormia de noite pensando em ser patrono, uma coisa de louco.

– Fica tranquilo. A tua vez vai chegar – dizia um com sorriso cínico.

Quanto mais eu explicava que tanto fazia, mais era consolado.

– Vai dar, vai dar...

Fui patrono de uma vinte feiras em cidades do interior do Rio Grande do Sul. Neste ano, serei em Lagoa Vermelha e Camaquã. Mas continuo ouvindo em tom de consolo:

– Um dia tu vais ser patrono de alguma feira no interior. É assim que se começa.

Cansado dessa conversa, passei a rejeitar a inclusão do meu nome na lista de patronáveis. Todo ano, como aconteceu neste, recebo o telefonema gentil da Câmara do Livro. Digo não. Nos anos em que fui patronável, os ganhadores, nem que fosse por tempo de serviço, mereciam mais do que: Frei Rovílio, Antônio Hohlfeldt, Charles Kiefer, Carlos Urbim, Paixão Cortes, Alci Cheuiche, etc. Agora que deixei de ser patronável, até por ser um mero escritor vira-lata palomense, um cronista "midiocre", um autor mínimo, não só minimalista, a maldição aumentou. Um maldito não pode fugir à maldição.

Pessoas que não falavam comigo há meses ou anos, mandam e-mail:

– Que injustiça! Nem na lista de patronáveis tu consegues mais entrar.

Passei de coitado que não ganhava a coitado que nem concorre.

Como é doce ser maldito.

Não quero ser patrono.

Não dou a mínima para ser patrono.

Não mereço ser patrono.

Tenho candidato a patrono deste ano: David Coimbra.

Se eu fosse escolher, como já disse, para os próximos anos, seriam: Luiz de Miranda, Sérgio Faraco e João Gilberto Noll. Eu jamais me escolheria para patrono. Como disse um cavalheiro, durante meu último lançamento, como elogio estratosférico à minha obra persistente e caudalosa:

– Eu que li desde o primeiro livro, posso dizer: como melhorou!

Uau!

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