As árvores do Hospital de Clínicas

As árvores do Hospital de Clínicas

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Por Renzo Bassanetti

Em março de 1977, eu e um amigo, Marcos Sobral (hoje residindo em MG), recém egressos no curso de Biologia da UFRGS, passávamos freqüentemente diante dos gramados do HCPA para assistir aulas no prédio do Ciclo Básico, na esquina da Ramiro com a Ipiranga. Imaginando como a área melhoraria com a presença de árvores – mais sombra, menos ruído para os pacientes do hospital, aumento da presença de pássaros e mais um pulmão para a cidade, resolvemos tentar agir.

Chegado o inverno desse ano, época mais adequada para o plantio, através do DAIB (Diretório Acadêmico da Biologia), contatamos a direção do HCPA e seu setor de Arquitetura solicitando a autorização para a realização de um mutirão de estudantes para arborização do entorno com espécies nativas. Obtido o sinal verde depois de alguns dias, oficiamos (também através do DAIB) à Secretaria Estadual da Agricultura, para que nos fornecessem cerca de 1700 mudas, totalizando 48 espécies, da sua Estação Experimental de Santa Maria.

Recebemos resposta positiva, com a ressalva de que só dispunham de mudas de 23 das espécies solicitadas e que teríamos que providenciar no transporte das mesmas a Porto Alegre. Procurando a Reitoria de Extensão da Universidade, esta nos orientou a contatar a direção da Faculdade de Agronomia, que dispunha de um pequeno caminhão usado para o transporte de verduras para o Restaurante Universitário (RU),

Depois de alguns dias, o pedido foi aceito, de forma que, em 19 de agosto de 1977, devidamente autorizados, Sobral e eu acompanhamos o motorista até Santa Maria para trazer as cerca de 1700 mudas.

O mutirão iniciou em seguida. Tínhamos conseguido uma planta da área de entorno do HCPA, onde fizemos um mapa com a distribuição das espécies (para evitar o plantio de exemplares de grande porte junto à passeios e construções). Participaram da abertura das covas dezenas de estudantes do curso de Biologia (além dos já citados e entre outros), Manoel Paiva, Ronimar Del Pino, Salete Crusciel, Tânia Orozko, José Joaquim Monteiro Jr, o hoje artista plástico Jorge Hermann, outros da Agronomia, e Geologia da UFRGS, alguns já falecidos, como o geólogo Werner Schriever e o botânico César Rodrigues.

Imaginávamos que em duas ou três semanas terminaríamos a empreitada, mas o solo era muito duro, cheio de entulhos e caliça da época da construção do hospital, de forma que o trabalho se estendeu por mais de dois meses, indo até o início de outubro. Face à má qualidade do solo, a direção do HCPA nos disponibilizou duas caçambas de húmus para colocação nas covas. Aliás, faço a observação de que ainda estávamos na fase final dos anos de chumbo, e o hospital era dirigido por um coronel (infelizmente não recordo o nome) mas este pelo menos teve a sensibilidade de não dificultar nossa ação, em algumas ocasiões liberando o refeitório para os participantes do mutirão e atendendo o que solicitávamos (como por exemplo, o humus e as estacas para fixar as mudas

Terminamos não utilizando todas as mudas no entorno do HCPA, onde foram plantadas cerca de 1200 O restante - cerca de 500 - foi plantado em torno dos prédios dos Cursos de História e Sociologia, já funcionando no novo (e então odiado) Campus do Valle, atividade concluída no final de outubro.

Os documentos que restam da atividade são uma planta do hospital com a localização das mudas e e um comprovante de entrega das mesmas pela Secretaria da Agricultura, que mantive comigo. Os demais documentos - cópias dos ofícios ao HCPA, à Reitoria, à Secretaria de Agricultura, etc - foram jogados fora por alguma gestão posterior do DAIB. Há 5 anos, estive na sede desse diretório e não se encontrou o menor vestígio de nada.

 

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