Brasil, país da impunidade?

Brasil, país da impunidade?

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Em 1886, o senador Dantas denunciava na tribuna:  “Abro um parêntese para dizer que agora e sempre dou aos fatos o valor que eles merecem, por si mesmos ou pela fonte de que procedem. Jamais serei fácil em aceitar informações mal fundadas, venham de onde vierem. Não tenho nenhum empenho de inventar motivos para acusar o governo – basta-lhe o peso que já tem sobre os ombros. Portanto, como ainda ontem mostrei, quando as informações não me merecem toda a confiança, ou quando os fatos que chegam ao meu conhecimento não estão de tal sorte esclarecidos que sobre eles, antes de trazê-los ao conhecimento do governo, não tenho podido chegar a um juízo seguro, demoro-me até obter esclarecimentos. Isto quer dizer que não tenho impaciência para fazer acusações ao governo; e quem dera que nunca tivesse motivos para fazê-las!”.

Está no meu livro “Raízes do conservadorismo brasileiro”.

Ele continuava a leitura: “Este fato, de cuja veracidade estou certo, e que o Dr. Santos Pereira não se negará a acentuar, sendo a isso provocado, prova que houve por parte do juiz executor pouca piedade na aplicação dos açoites, que a sentença pouco humana do juiz de direito levou ao número de 300!... O Ministro da Justiça não leu perante o Senado a parte do telegrama do juiz de direito onde declara que os escravos foram daqui conduzidos pelos empregados de Domiciano, ajoujados fortemente por cordas finas nos punhos e nos braços; o que prova que não há desejo de se apurar a verdade. No telegrama, ocultou o juiz de direito a circunstância de serem os escravos conduzidos desta cidade a trote, acompanhando a marcha dos animais que levaram os empregados de Domiciano; e como estavam os escravos impossibilitados de correr, por seu estado de entorpecimento depois de seis meses de prisão, começaram a tomar chicote desde a porta da cadeia desta cidade”.

Precisaria mais para descrever a escravidão no Brasil dos seus primórdios até os seus últimos e sempre tristes e cruéis anos?

O juiz “esclareceu ao ministro da Justiça: “A cada um dos escravos condenados a 300 açoites, foram aplicados 50 de cada vez, nos dias em que se achavam em condições de sofrê-los sem perigo. Segundo a opinião de dois médicos, estes açoites não concorreram absolutamente para a morte dos dois escravos. Tal é também o juízo das pessoas que viram o bom estado deles antes e por ocasião de serem entregues”.

O Brasil hoje é o terceiro país do mundo em população carcerária com 726 mil detentos segundo dados do Ministério da Justiça. País da impunidade? Para quem? Em torno de 40% dos presos continuam sem julgamento. Em Sergipe são 65%. No Amazonas, 64%. Os negros representam 64% dos presidiários embora sejam 53% da população brasileira. Os presos analfabetos ou semialfabetizados somam 60%. As penas são baixas? Nas masmorras brasileiras cada ano passado deveria contar por dez. Esses dados absolvem os criminosos? Claro que não. Mas ajudam a perceber a origem do problema. Ela se chama desigualdade. Atende também pelo sobrenome: história da exclusão social no Brasil.

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