Continho de Natal

Continho de Natal

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Era uma vez um país corrupto, mas um país tão corrupto que o partido da situação, depois de ter sido campeão da moralidade quando era oposição, vivia agora atolado em escândalos e roubalheiras, tendo por adversário um partido com um número equivalente de escândalos. Esse país, situado no sul da mundo, chocou um menino de nove anos, que escreveu uma carta ao Papai Noel com um único e pungente pedido:

– Papai Noel, só te peço um presente, que nossos políticos se tornem honestos e nunca mais roubem um centavo do dinheiro público.

O Bom Velhinho coçou a longa barba e ficou sem saber o que responder. Esboçou uma primeira carta bastante sincera e direta:

– Acho que está havendo uma pequena confusão, meu querido amiguinho. Não sou santo nem Deus. Dou presentes, não faço milagres.

Já ia assinar quando se deu conta que não tinha o direito de responder de maneira tão crua a uma criança. Como poderia tirar as ilusões de um menino com tanta crueldade? Obrigou-se a pensar melhor. Depois de muitos rascunhos e de algumas noites insones, respondeu:

– Vou dar uma parada na Suécia para ver como eles fazem.

Chegou a selar o envelope. Desistiu. Quem sabe um e-mail? O problema agora era a reação do pai da criança. E se fosse um neoliberal desses que não gostam de pagar impostos e querem privatizar tudo? Poderia acusá-lo de tentar influenciar o guri com o mau exemplo da Suécia, onde, satisfeitas, as pessoas pagam 45% de impostos sobre seus ganhos e têm, em contrapartida, ensino gratuito em todos os níveis, estradas sem pedágio e saúde de qualidade.

– Meu filho, o seu pedido está fora do meu alcance. Só os adultos do seu país, que votam, poderão acabar com os políticos corruptos.

Foi o que Papai Noel escreveu, mas não se atreveu a enviar. Só lhe restava não responder. Silenciar era uma covardia. Papai Noel não se sentia bem no papel de covarde. Foi aí que ele teve uma ideia genial: presentear os adultos do país com uma relação completa e comprovada de todos os políticos e empresários corruptos. Papai Noel acionou os seus colaboradores, sem necessidade de deleção premiada, para compor a lista o mais rapidamente possível. Faltavam 24 horas para o Natal e o trabalho continuava. Papai Noel não queria ser injusto e consultava cada acusado antes de incluir o seu nome.

– Sou inocente – era a resposta de cada suspeito.

Ingênuo, Papai Noel acreditou. Escreveu, então, para o garotinho que esperava, já caindo de sono, o seu presentinho.

– Meu amiguinho, o seu país é o país dos inocentes. Seja feliz.

O guri leu a mensagem e ficou de olhos arregalados. Não chorou, não riu, não se manifestou na hora. Foi dormir. Ao acordar, recebeu muitos presentes. A mãe dele entregava os pacotes e dizia feliz:

– Olha o que Papai Noel te deixou.

¬– Não foi Papai Noel, foi você.

– Claro que foi Papai Noel.

– Não acredito mais em Papai Noel. Não sou inocente.

 

 

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