Corrupção: Parcerias Público-Privadas

Corrupção: Parcerias Público-Privadas

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Nem toda PPP (Parceria Público-Privada) é corrupta.

Parece que toda corrupção no  Brasil é PPP.

A corrupção se dá na zona hachurada entre Estado e Empresa privada.

A administração dos presídios de Manaus revelou que a necessária eficácia da gestão privada é um mito.

Silêncio absoluto.

As duas grandes tragédias brasileiras recentes são privadas: a da Samarco, em Minas Gerais, e a da Umanizzare.

No caso de Manaus, um esquema redondo: agentes públicos cedem atribuições do Estado a uma empresa privada, com preços superfaturados, recebendo em troca financiamento de campanha e votos de presidiários.

A cada parte o seu quinhão.

Ou o Estado faz ou a iniciativa privada faz.

Quando os dois fazem juntos é que pode dar rolo.

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Assassino politizado?

O homem que matou a mulher, o filho e mais uma dezena de pessoas em Campinas, na virada do ano, embrulhou o raciocínio de muita gente. Dominado pelo ódio, envelopou seu crime com um discurso político coincidente com o que predomina em certo imaginário de direita nos últimos tempos. Gerou um paradoxo. Não falta gente para dizer: “Apesar do que fez, ele tinha razão em muita coisa”. Em que mesmo? Nas simplificações odiosas?

Numa carta, o assassino politizou seu ato: “Não tenho medo de morrer ou ficar preso, na verdade já estou preso na angustia da injustiça, além do que eu preso, vou ter 3 alimentações completas, banho de sol, salário, não precisarei acordar cedo pra ir trabalhar, vou ter representantes dos direito humanos puxando meu saco, tbm não vou perder 5 meses do meu salário em impostos”. Nas redes sociais, não faltaram aplausos para essa suposta “consciência” da realidade. O Brasil foi ao seu abismo.

O serial-killer disparou contra alvos de muita gente “de bem”: “Morto tbm já estou, pq não posso ficar contigo, ver vc crescer, desfrutar a vida contigo por causa de um sistema feminista e umas loucas”. Atacou a sociedade do espetáculo responsabilizando-a por seu ressentimento: “No Brasil, crianças adquirem microcefalia e morrem por corrupção, homens babacas morrem e matam por futebol, policiais e bombeiros morrem dignamente pela profissão, jovens do bem (dois sexos) morrem por celulares, tênis, selfies e por ídolos, jornalistas morrem pelo amor à profissão, muitas pessoas pobres morrem no chão de hospitais para manter políticos na riqueza e poder!” Arranjou imediatamente defensores.

Amparado no discurso redutor que semeia o ódio como solução pacificadora, o assassino rotulou de “vadias” as mulheres que não seguem o padrão do patriarcalismo brasileiro tradicional. Encontrou espaço para atacar o ministro do STF, Ricardo Lewandowski, presidente da sessão do Senado que destituiu a presidente Dilma Rousseff, que insultou também de “vadia”, e repetiu o mantra do conservadorismo dominante, “as leis deste paizeco são para os bandidos e bandidas (...) Se os presidentes do país são bandidos, quem será por nós?”

O manifesto misógino atingiu o seu ápice nesta passagem deletéria: “tenho raiva das vadias que se proliferam e muito a cada dia se beneficiando da lei vadia da penha!” O fechamento como que pede o apoio daqueles que postulam outro sistema: “Família de policial morto não recebe tantos benefícios como a família de presos. Cadê os ordinários dos direitos humanos? Estão sendo presos por ajudar bandidos né?” Eis uma revelação.

Uma revelação do estado de contradição em que se encontra o país, acossado por seus medos, ressentimentos, incitações ao ódio e ideologias como deformações do possível. A demagogia fascista costuma reduzir o complexo ao simples para melhor impor sua lógica de banalização da violência. A única conclusão possível certamente vai desagradar: esse homem estava profundamente doente.

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Modo covarde de ser?

 

     Quem quer ser herói? Ninguém. Salvo em algum reality show com direito a 15 segundos de fama. Uma das cenas mais chocantes de 2016 foi a da morte por espancamento do vendedor ambulante no metrô de São Paulo. Uma imagem comum do cotidiano das megalópoles? Talvez. O detalhe que bate no olho, enquanto os assassinos espancam a vítima, é a presença de pessoas que não ousam intervir. O medo impera. Ninguém ousa tomar a iniciativa. No hiperespetáculo, somos todos plateia. Contemplamos ao vivo a morte se concretizar. Figurantes na cena do crime.

Não julgo. Também me acovardo. O ambulante que morreu teve coragem para interferir. Será citado certamente como exemplo do que não se deve fazer. Se for atacado, não reaja. Se presenciar um ataque, não se meta. Se puder, corra. Se não puder, finja-se de morto. Sobreviva mesmo que para isso tenha de ignorar a dor alheia. Diz a sabedoria popular que mais vale um covarde vivo do que um herói morto. O problema disso é que, se não tento salvar o outro, quem tentará me salvar?

Na cultura do medo, a vida do outro perde o valor. O filósofo Jean Baudrillard dizia, com seu gosto pelas ironias e pelos paradoxos, que a força dos terroristas estava no fato de aceitarem morrer por uma causa, não aceitando negociar ou vender-se para obter alguma vantagem. Como enfrentar essa falta de medo da morte? Afirma-se que a violência cresce no Brasil por causa da impunidade. E se for ainda mais grave: a indiferença em relação à punição contra o medo paralisante de morrer?

Quando não temos mais qualquer condição de reagir, mesmo diante do horror mais imediato e vulgar, não nos tornamos reféns daquilo que desejamos extirpar? A indiferença diante da punição pode ter um aliado no campo oposto: a indiferença diante da desigualdade. É claro que a desigualdade não explica todos os crimes. Mas chama a atenção que em países menos desiguais haja, em geral, menos violência. E mais punição? Possivelmente. Se aumentar o grau de punição e diminuir o grau de igualdade os índices positivos ainda permanecem ? Dificilmente.

O ano de 2016 acabou com um massacre numa prisão em Manaus, com uma chacina em Campinas e com o assassinato, no Rio de Janeiro, do embaixador grego no Brasil, ao que consta pelo amante da sua mulher, mandante do crime. Por quê? Como é possível que no século XXI ainda se resolva um caso de triângulo amoroso como a eliminação de um dos elementos da geometria sexual? A ciência avança. A tecnologia progride. As relações sociais mudam. Os seres humanos continuam primitivos. A cultura do medo tem ajudado a nos transformar em covardes invisíveis. Que podemos fazer diante da explosão de barbárie cotidiana?

O amor nem sempre segue a lógica da distinção social? A mulher do embaixador, com residência na Baixada Fluminense, preferia a cama do soldado da PM? Por que não se separou do marido? Ela diz que sentia medo dele e que era agredida com frequência. Nelson Rodrigues permanece melhor sociólogo e psicólogo do que muitos especialistas no assunto. O humano convive com seu violento animal.

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PPP: Parcerias Políticas Privatizadoras.

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