Enganos assustadores do temerismo

Enganos assustadores do temerismo

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Em Samarcande, a morte encontra a sua vítima, que tenta fugir.

A “velha senhora” é rápida. Alcança a sua presa, que se defende:

– Tem certeza de que é a minha vez?

A morte aceita olhar a sua agenda eletrônica. Atrapalha-se um pouco com o i-phone. Por fim, transparente, desculpa-se como pode:

– Foi engano. Lamentável. Voltarei amanhã.

A comunicação do governo Michel Temer, ou do seu entorno, lembra um pouco esse encontro em Samarcande. Houve o momento em que um empresário falou em jornada de 80 horas semanais de trabalho.

– Foi um engano. Eu queria dizer 60 – corrigiu-se.

Ufa! Que alívio. Depois disso, o ministro do Trabalho referiu-se a uma jornada de labuta diária de 12 horas. Era mais um engano. Só valia para situações especiais já existentes. Mesmo assim, o ministro tomou puxão de orelha do presidente da República. Mais recentemente, na Medida Provisória da reforma do ensino médio, educação física e artes deixaram de ser disciplinas obrigatórias. O Ministério da Educação correu para avisar que fora um engano. Mas o texto da MP publicado em edição extra do Diário Oficial manteve o “engano”, que deverá ser corrigido por outro caminho. Salvo se for mais um engano.

De engano em engano, o governo vai assustando a plebe e testando a sua reação. Vai que cola! Vem aí a reforma da Previdência. A reforma trabalhista, se não for engano, ficou para o segundo semestre de 2017. É engano pensar que esse adiamento tem a ver com as eleições de agora. Michel Temer teria dito com pompa: “Ledo engano”. A Previdência não pode esperar. Vai ou racha. Já se falou em idade mínima de 70 anos para pendurar as chuteiras pelo INSS. Mais um engano. Não deve passar de 65 anos. No Maranhão, porém, a expectativa média de vida é de 66 anos. Exceto quando a morte comete um engano.

– Confie em mim – disse a morte a um dos seus escolhidos.

– Por que eu deveria confiar?

– Eu conheço o seu destino.

– Quem lhe mandou aqui tão cedo?

– O Sarney e a história do Brasil – teria dito candidamente a Dama.

Um dos pontos cruciais das mudanças na Previdência é o tempo de contribuição para acesso ao benefício integral da aposentadoria. Vazou – tudo vaza por engano – que o governo pensa em 45 ou 50 anos. Uau! Até agora, que eu saiba, o governo não soltou o seu bordão:

– Foi engano.

O professor Aníbal Damasceno – um mestre da comunicação peripatética, gostava de conversar caminhando ou parado, em pé, nas alamedas da universidade ou nas ruas do centro da cidade – sustentava que todo homem nasce para se aposentar. Isso pode mudar. Salvo engano, o homem se aposentará para morrer, se não morrer antes de atingir a grande meta existencial. O resto será visto como corporativismo. Não deixa de ser verdade: apego ao corpo, à vida. Em Samarcande, a morte voltou no dia seguinte para buscar sua vítima.

– Tem certeza de que não é engano de novo?

– Não. Mudamos a nossa estratégia de comunicação.

*

O secretário da Educação do Rio Grande do Sul, Luís Antônio Alcoba de Freitas, enviou e-mail sobre meu texto relativo à escola Paula Soares, que pode ser acessado em meu blog: www.correiodopovo.com.br

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