Escravistas e antiescravistas

Escravistas e antiescravistas

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Divisões históricas

 

      O Brasil esteve dividido em muitos momentos da sua história. Por exemplo, em 1871, quando da votação da Lei do Ventre Livre, em 1885, com os embates que levariam a Lei dos Sexagenários, e 1888 com a Lei Áurea. Nesses três momentos vozes se levantaram contra a nefasta polarização. O escritor e político José de Alencar, uma celebridade, caracterizou a lei do Ventre Livre de “iníqua, bárbara e sinistra”.

Alencar denunciava a divisão que se criaria nos lares fazendo livre os filhos de escravos: “Quando a lei do meu país houver falado essa linguagem ímpia. O filho será para o pai a imagem de uma iniquidade; o pai será para o filho o ferrete da ignomínia; transformareis a família em um antro de discórdia; criareis um aleijão moral, extirpando do coração da escrava esta fibra, que palpita até no coração do bruto, o amor materno!” Melhor que todos fossem escravos.

Um deputado foi ainda mais direto contra os perigos da lei: “Vai dividir em duas classes a população servil dos estabelecimentos agrícolas”. O senador Paulino de Souza brandia o chicote do direito para evitar o que considerava uma hedionda divisão: “No direito do senhor compreendem-se o dominium e a potestas: em relação ao domínio, o escravo é objeto de propriedade, e, portanto, equiparado à coisa; em relação à potestas é que os textos do direito romano o denominaram persona, e como tal o consideram, nesta parte, as nossas leis”.

A conclusão “técnica” do senador foi aplaudida pelos que pregavam a unidade da nação: “As escravas são propriedade, e propriedade são os filhos que tiverem, como são os que têm tido até hoje, sujeita aos mesmos princípios que regulam o direito de propriedade em geral, aos quais a lei não fez exceção com relação a eles, como atestam a jurisprudência de todos os tempos neste país, a doutrina dos jurisconsultos, os julgados dos tribunais”.

José de Alencar atacava os divisionistas e baderneiros: “A liberdade compulsória, a pretexto de salvação, ou de arbitramento, é uma arma perigosa, que se forja para os ódios, as intrigas e malquerenças das localidades; e com a qual se há de violar o asilo do cidadão, perturbar a paz das famílias, e espoliar uma propriedade que se pretende garantir”. Em nome do “bom senso” e da paz, advertia: “Vós, os propagandistas, os emancipadores a todo o transe, não passais de emissários da revolução, de apóstolos da anarquia. Os retrógrados sois vós, que pretendeis recuar o progresso do País, ferindo-o no coração, matando a sua primeira indústria, a lavoura”. Que passado!

Libertar os nascituros era para José de Alencar parte de um projeto de tomada do poder: “Essa proposta, que aí está sobre a mesa, não é mais do que um pretexto, para provocar a revolução; não é mais do que o precursor do projeto incubado no alto”. Quando chegou a hora da abolição, o senador Paulino de Souza atacou “tecnicamente” o projeto de lei rotulando-o de “inconstitucional, antieconômico e desumano”. O escravagista Barão de Cotegipe saiu-se com esta pérola:  “Tem-se querido tornar odiosos aqueles que pugnaram pela restrita execução da lei de 28 de setembro de 1885. Pretendeu-se dividir os brasileiros em escravocratas e não escravocratas”. Que absurdo!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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