Glau Barros, dama do samba

Glau Barros, dama do samba

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Faz horas que estou para escrever isto: o Rio Grande do Sul tem uma nova dama do samba.

Se preferirem, uma dona do samba. É a cantora Glau Barros. No final do ano passado, levamos o escritor martiniquense Patrick Chamoiseau, prêmio Goncourt pelo grande romance Texaco, para ouvir Glau num bar da Cidade Baixa. Ele ficou extasiado. Chamou-a de rainha de samba e elogiou o poder da sua voz. Patrick, como Glau, é negro e tem orgulhoso da negritude e da mestiçagem. Além disso, tem bom ouvido. Percebe nuanças e tons em segundos. Glau foi atriz durante um bom tempo. Andou cantando, muito bem, MPB. Finalmente abraçou o samba com sua voz envolvente. Ela vai bem interpretando sucessos de Elis Regina ou dando novos ares aos clássicos do nosso genial Lupicínio Rodrigues.

Hoje, Dia Internacional da Mulher, Glau vai cantar no Teatro São Pedro, a partir das 12h30, com entrada franca. O show tem um belo e justo nome: “Damas do samba”. A cantora terá o acompanhamento qualificado de Edu Moreira, no violão, Fernando Catatau e Cléber Junqueira, na percussão, e Alemão Charles, no cavaquinho. As damas homenageadas vivem em nosso imaginário: Dona Ivone Lara, Elza Soares, Elis Regina, Clara Nunes, Elizeth Cardoso, Leci Brandão e as gaúchas Zilah Machado, Delma Gonçalves e Pâmela Amaro. Se eu não estivesse voltando de férias, largava tudo e ia ouvir Glau na hora do almoço. Seria uma indelicadeza com a Taline no Esfera Pública, nosso programa na Rádio Guaíba, que já segurou a bronca sozinha durante todo o mês de fevereiro. Mas que dá vontade, isso dá. Resistirei bravamente.

Ouvir Glau Barros cantar “A voz do morro” é de arrepiar. Mas ela é ainda mais arrasadora em “Tristeza pé no chão”, da maravilhosa e inesquecível Clara Nunes: “Dei um aperto de saudade/No meu tamborim/Molhei o pano da cuíca/Com as minhas lágrimas/Dei meu tempo de espera/Para a marcação e cantei/A minha vida na avenida sem empolgação”. É lindo demais. Samba pode ser arte pura. Outra interpretação de Glau que me comove é “Pérola negra”. Neste país construído pelos negros, no qual a mulher negra ainda é incrivelmente mais discriminada do que os demais, não posso me impedir de querer homenagear todas as mulheres, em especial as negras, neste 8 de março, na figura de Glau.

Professora, atriz, cantora, mãe, namorada de meu amigo e agora seu produtor Celso Dias, a quem eu a apresentei, Glau está aí na batalha de todos os dias. Ela é a típica mulher brasileira em primeiro lugar: lutadora, sedutora, multicompetente, capaz de matar um leão por dia para poder soltar a sua bela voz. Faz tudo e mais um pouco. Para destacar o talento de alguém não é preciso fazer comparações, mas estas podem ajudar a passar a mensagem com mais facilidade: Glau Barros não perde em nada para Teresa Cristina. Te liga, Caetano Veloso. Alô, Chico Buarque de Holanda. Glau faz a gente repetir aquele clichê que vale para Nei Lisboa e valia, na poesia, para Mario Quintana: se vivesse no Rio já era sucesso nacional. Por que não ser daqui mesmo? Toda aldeia agora é global. Só falta humanizar esse povoado.

 

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