Imprensa gaúcha ajoelhou-se diante dos generais

Imprensa gaúcha ajoelhou-se diante dos generais

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Não houve grandeza. Apenas conservadorismo.

Meu aluno de iniciação científica Douglas Cauduro está pesquisando sobre a relação entre a imprensa de Porto Alegre e do interior do Rio Grande do Sul com o golpe de 1964. À exceção da Última Hora, todos os jornais apoiaram a derrubada de João Goulart e louvaram a chegada dos militares ao poder. O interessante é conhecer os termos usados e os argumentos sustentados. Em alguns casos, a retórica, passadas mais de cinco décadas, parece até humorística. As paixões estavam à flor da pele.

Bater era a única palavra de ordem.

O Jornal do Dia foi um dos mais golpistas. Em 26 de abril de 1964, a coluna de Gilberto Grande, sob o título de “A lição do Brasil”, defendia um conceito de democracia que ainda faz sucesso na imprensa saudosa dos democratas fardados e sempre pronta a mentir para se fortalecer como verdade: “A democracia é isto: os operários trabalhando ordeiramente nas fábricas e nas oficinas, longe das ingerências dos profissionais da baderna, que os estimam não como homens, mas como massa. (...) Em seu discurso de posse nosso valoroso presidente pronunciou as palavras que há muito desejávamos ouvir. Falou como um verdadeiro apóstolo da dignidade, da honradez, como um mensageiro da paz, escravo do dever, que na idade de ensarilhar as armas volta ao campo de batalhas, assume as rédeas de um poder que nunca ambicionou, para reconstruir e libertar a sua pátria”.

Antonio Loebmann, no Jornal do Dia de 7 de maio de 1964, ia mais longe: “Em última hora um povo se levantou aos 31 de março e sacudiu as correntes férreas do comunismo ateu e desumano, que traidores lhe queriam impor (...) de maneira super humana e bem cristã os brasileiros resolveram, com o auxílio de Deus e sua mãe, em dois dias e meio com meia dúzia de mortes, o que a outros como os espanhóis tem custado anos de guerra civil e milhões de mortos”. A Folha da Tarde, em 31 de março, citava o New York Daily News. “O Brasil, a maior república da América do Sul, encontra-se num perigoso estado de fermentação. Tem um rico e caprichoso radical chamado João Goulart na presidência, uma inflação galopante que preocupa muitos brasileiros, um movimento operário dominado pelos comunistas e uma camarilha militar de direitistas extremistas. Fidel Castro, em Cuba, evidentemente está dando ordens aos vermelhos brasileiros, que acusam os militares de conspirar para derrubar Goulart”.

Quem tinha razão? Para o Correio do Povo a queda de Jango foi o “fim de pesadelo”.

Um artigo barroco de Assis Chateaubriand, no fervoroso Diário de Notícias, para quem o golpe fora uma “revolução democrática”, tentava, em 3 de junho, legitimar a situação: “Estejam tranquilos nossos compatriotas. Aqui não é só a força de terra que está monolítica. Também a sua aglutinação com o poder civil e a gente montanhesa, faz um bloco ‘portland’, que permite Minas tomar em sua mira, o futuro garantido do monumento revolucionário”. Zero Hora surgiu 34 dias depois do golpe, no lugar da Última Hora, com a seção ZH Militar. Em 10 de junho, um título dizia tudo: “Diretores de ZH visitaram comandante do III exército”.

Receberam elogios do general Poppe Figueiredo pela linha editorial do veículo.

Em 1970, o jornal publicaria a sua famosa manchete: “Ano VI da revolução democrática”.

A fase de acumulação primitiva do capital é sempre um capítulo a ser esquecido.

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