Luz verde no céu da existência

Luz verde no céu da existência

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Semana passada foi vista uma estranha luz verde nos céus do Rio Grande do Sul, do Uruguai e da Argentina.

O que seria?

Um disco voador?

Os restos de um meteorito. Os especialistas, como sempre, deram explicações aparentemente convincentes. "Provavelmente é um fragmento de cometa de tamanho maior do que o normal, que se incendiou durante sua descida pela atmosfera da Terra", esclareceu à BBC César Bertucci, pesquisador do Instituto de Astronomia e Física Espacial da Argentina (IAFE). Pode ser.

Deve ter sido. Eu preferia que tivesse sido a nave de um ET.

Durante muito tempo, achei irracional a existência de vida fora da Terra. Hoje, acho o oposto.

Por que só haveria vida na Terra? Por que seríamos os únicos escolhidos para ter vida e, se esta afirmação for razoável, vida inteligente? Certos programas de televisão parecem atestar o contrário. O astrônomo Jorge Coghlan, do Centro de Observadores do Espaço (CODE), foi mais instigante: "O que se viu na Argentina foi matéria interplanetária, um bólido. A Terra recebe permanentemente estes fenômenos, são restos de formações dos planetas”. A luz verde me fascina. Deve ter sido influência de um dos melhores livros que já em meus 53 anos: O grande Gatsby, de Francis Scott Fitzgerald.

O final desse romance é deliciosamente melancólico: “Gatsby acreditou na luz verde, no orgiástico futuro que, ano após ano, se afastava de nós. Esse futuro nos iludira, mas não importava: amanhã correremos mais depressa, estenderemos mais os braços... E, uma bela manhã... E assim prosseguiremos, botes contra a corrente, impelidos incessantemente para o passado”. Terá sido a luz verde do futuro que passou rapidamente pelo nosso sul do mundo denunciando o passado? Terá sido a luz verde da crença num Brasil melhor vendida pelo PT e que agora morre lentamente sob os escombros da corrupção?

Terá sido a luz verde da crença num Rio Grande do Sul diferente do resto do país?

Fitzgerald foi o escritor da “geração perdida”. Era uma perdição com charme. O mundo de Gatsby era de grandeza e corrupção. Karl Marx sugeriu que a história só se repete como farsa. A luz verde dos céus da semana passada seria o sinal de que entramos definitivamente na farsa de uma segunda perdição? Um sinal para os gaúchos que, a cada quatro anos, mudam de perspectiva? Numa, apostam na solução desenvolvimentista estatizante. Na outra, escolhem a solução neoliberal privatista do Estado mínimo. Gatsby surpreendera-se ao ver pela primeira vez a luz verde do outro lado: “Ele viera de longe, até aquele relvado azul, e seu sonho deve ter-lhe parecido tão próximo, que dificilmente poderia deixar de alcançá-lo.

Não sabia que seu sonho já havia ficado para trás, perdido em algum lugar, na vasta obscuridade que se estendia para além da cidade, onde as escuras campinas da república se estendiam sob a noite”. Deve ter sido isso.

A luz verde passou por nós quando o Estado e o país se desintegravam como um meteoro em contato com a nossa atmosfera. Continuaremos a correr com os braços estendidos para os sonhos. De minha janela, espio o horizonte e tento enxergar a luz verde que me fez, na juventude, acreditar num futuro dourado com o sol da infância e como o trigo da fotografia.

 

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