Mais um mico brasileiro

Mais um mico brasileiro

publicidade

Brasil em chamas


 

      Distanciamento é uma categoria muito importante para ver melhor em certas situações. É o que costuma acontecer com historiadores. O jornal norte-americano New York Times não perdoou: "Golpe duplo contra um tesouro: negligência e, depois, fogo - Brasil chora a perda de um museu e o declínio da Nação". O que não vira pó, desaparece nas chamas. Não tinha água no hidrante. Não tinha verba para a manutenção do Museu Nacional. Não havia pressa em prevenir. Quase tudo se perdeu.

A manchete do NYT rima com outras duas da Folha de S. Paulo: “Governo Temer termina marcado pelo pior ciclo de crescimento em cem anos” e “Reforma do Maracanã bancaria manutenção do Museu Nacional por 2,4 mil anos”. Tudo está dito. Cada um com suas prioridades. Cada qual com suas ilusões. Acima de tudo os negócios. O Brasil insiste em ser uma cadeia de erros compartilhados. Tudo se contingencia, eufemismo para corte de despesas fundamentais, menos a bolsa-banqueiro. Essa é intocável. Juros da dívida pública são sagrados. A nossa jabuticaba mais cara é esta: somos um dos raros países do mundo que não cobram imposto sobre lucros e dividendos. Outro é a Estônia. Essa frutinha foi plantada por FHC. A turma dos camarotes não cansa de se lambuzar.

Estamos fechando o ciclo com aumento de 16,38% para a magistratura, essa mesma que não abre mão do indecente auxílio-moradia, um penduricalho que corrompe três valores de uma só vez: a moralidade, a igualdade e a impessoalidade. Ganha quem tem nome. Leva quem menos precisa. Essa jabuticaba também não paga imposto de renda. Só no Brasil mesmo magistrado ganha auxílio para morar tendo casa própria. Só no Brasil mesmo show comercial é financiado com isenção fiscal e museu fica à espera da generosidade de algum tecnocrata.

Deixamos o mundo perplexo com nossa originalidade. Construímos estádios bilionários onde nem tem futebol. Ameaçamos cortar verbas de bolsas de estudo. Não damos a mínima para a agonia de hospitais como as Santas Casas. O jornal francês Le Monde não economizou em críticas: “A tragédia do museu do Rio despertará as consciências? Em plena campanha eleitoral o tema da preservação dos museus só figurava em dois dos treze programas”. O fogo foi apagado. As cinzas permanecerão ardendo. Só no Brasil mesmo filho candidato posta em rede social que vão mudar o sistema corrupto nem que seja à bala. Só no Brasil mesmo candidato faz propaganda eleitoral com quadro de ditadores ao fundo.

Libération foi cáustico na manchete: “Museu Nacional em chamas, austeridade piromaníaca”. O jornal francês destacou o corte das verbas da instituição em 85% depois da ascensão de Michel Temer. Lembrou que o último presidente da República a visitar o Museu foi JK. Enfatizou que em junho deste ano, quando das comemorações do bicentenário do Museu Nacional, nenhum ministro se interessou em dar as caras por lá. Chamou a turma austericida que reina em Brasília de “tea party tropical”, uma alusão à extrema-direita norte-americana mais raivosa. E Temer ainda se queixa que ninguém o defende. Ninguém é louco. Salvo os amigos do peito.

 

 

 

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895