Maluf e Lula, PSOL, DEM, PSDB e PP, vou-me embora para Palomas, lá, ao menos, sou amigo do lobisomem

Maluf e Lula, PSOL, DEM, PSDB e PP, vou-me embora para Palomas, lá, ao menos, sou amigo do lobisomem

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Eu pensava ter visto tudo em Palomas.

Vi lobisomem. Era bastante comum. Tinha um que andava de camiseta de Grêmio. Outro, pretendia ser candidato a vereador pela Arena. Um deles se apaixonou pela filha do estancieiro e passava as noites uivando embaixo de um umbu.

Certa madrugada, vi uma mula sem cabeça. Estranhamente ela tinha orelhas e usava minissaia.

Vi até um bacanal com cabras.

Em Palomas, acontecia de tudo: aparecia tuparamo, guerrilheiro carioca em fuga para o Uruguai, revista de mulher pelada, virgem grávida, grávida virgem, homem com três pernas, terneiro com duas cabeças, corno feliz e domador domado.

Eu tinha, portanto, visto tudo.

Mas, agora, de Porto Alegre, vi duas coisas que nem em Palomas aconteceriam: o aperto de mãos entre Lula e Maluf, a aliança entre o pai dos pobres e o rei dos ricos, entre aquele que fora o paladino de uma nova moral e aquele que, segundo o PT, encarnava a velha e secular corrupção, o ladrão mais ladrão de todos os tempos, o rouba, mas faz, embora nem tanto.

Nunca pensei viver tanto. Sinto-me agora um ancião. Em certo sentido, já posso morrer.

O ódio da direita ao PT nada tem a ver com a corrupção. Nada tem a ver com as mentiras que o PT contou. Foram muitas. Entre elas, que jamais faria certas alianças e que era realmente um partido diferente. O ódio ao PT vem das verdades que disse um dia. Essas verdades que fizeram do PT a cristalização da arrogância, da prepotência e da certeza, o dono da verdade.

Acabou. Não há mais verdades.

Lula absolveu Maluf.

A isso se chama aliança programática.

Tudo para tentar fazer decolar um candidato de laboratório, Fernando Haddad, incapaz de voar sozinho.

Eu havia visto tudo.

Não, sinceramente, faltava ainda um último passo.

Aconteceu. Em Resende.

Lá, o PSOL, último bastão da pureza ideológica com representantes em parlamentos, aliou-se com o PP, o DEM e o PSDB.

Digam-me que é mentira. Digam-me que é uma alucinação. Digam-me que enlouqueci. Provem-me que isso é bom. Convençam-me de que raciocino com categorias velhas, fechadas, sectárias. Salvem-me desse desejo de coerência.

Deu.

A última reserva ideológica do Brasil – pois, pelo jeito, as ideologias, de fato, acabaram – é a parte do PP de Porto Alegre que recusou a aliança com o PCdoB. Um pepista me explicou: "Que razão teríamos para trocar Fortunati por Manuela?"

Faz sentido. Pragmático. Mas não me convence. Foi por ideologia mesmo.

Vou voltar para Palomas.

Lá, ao menos, sou amigo do lobisomem, que não faz mal a ninguém.

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