Matar a cobra (ou o Falcão) e mostrar o porrete

Matar a cobra (ou o Falcão) e mostrar o porrete

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Quando Falcão assumiu o Inter, publiquei o texto que reproduzo abaixo.

A estranha lógica do futebol



A lógica do mundo do futebol é muito particular.
Um treinador que se sai muito mal de um clube, de onde foi demitido por ter sido, na opinião de torcedores e comentaristas, incompetente, pode ser contratado por outro clube como a salvação da lavoura.
Nenhuma empresa séria usaria esse método de avaliação profissional. Um executivo que leva uma empresa à falência ou a ficar muito longe de alcançar as suas metas dificilmente seria contratado para tirar outra empresa do buraco. Ou seria? O paradoxo do futebol é este: a culpa é sempre do treinador, tanto que, se os resultados não chegam, ele é demitido, mas, ao mesmo tempo, ele nunca é culpado de coisa alguma, pois, com freqüência, é imediatamente contratado por outro clube, o qual aposta que, noutro contexto e com outros jogadores, tudo poderá dar certo. O culpado é prontamente absolvido. Que coisa!

Veja-se o rendimento dos principais treinadores brasileiros: quantos anos faz que Luxemburgo não ganha um título? Mesmo assim, continua recebendo uns R$ 500 mil por mês. E o Felipão? Dizem que ganha mais de R$ 1 milhão por mês. Não fatura um título desde 2002.
O futebol é talvez o único campo profissional em que nove anos de fracassos permitem novos contratos milionários e a renovação permanente da confiança em perdedores do presente que vivem de glórias do passado.
Celso Roth teve 56% de aproveitamento no Inter. Até uma porta, com o elenco do Inter, teria aproveitamento equivalente. Ganhou uma Libertadores da América em apenas quatro partidas. Qualquer outro treinador, ganhando R$ 20 mil, obteria o mesmo rendimento ou algo muito próximo.

Falcão, quanto treinou o Inter, se não me engano, ficou nos 50% de aproveitamento. O porteiro do clube alcançaria o mesmo desempenho. O que explica tão altos salários para tão baixos desempenhos? O futebol é irracional e o dinheiro é do clube, uma associação. O Inter contratou Falcão para resolver seus problemas.
Falcão não trabalha como treinador há, sei lá, 15 anos.
Como pode um profissional que não exerce sua atividade há 15 anos ser chamado para resolver uma situação de crise? Alguém chamaria um cirurgião parado há 15 anos para uma operação de alto risco? O pensamento mágico comanda o futebol. O Grêmio tem Renato, seu principal ídolo, como técnico. O Inter precisa ter Falcão. O futebol, a exemplo da vida, na frase do grande argentino Borges, gosta de leves simetrias. Não, no caso, de simetrias escancaradas.

O único técnico que pode apresentar um currículo recente com uma relação sólida entre salário e resultados é Muricy Ramalho. Ganhou quatro campeonatos brasileiros em cinco anos. Poderiam ser cinco em seis anos se o Inter não tivesse sido roubado em favor do Corinthians em 2005. Técnico existe para ser o sargento que policia a galera, jovem e rica, sedenta de sexo e emoções caras, e os motiva para vencer. Jogadores de futebol de clubes como o Inter ganham uma fortuna para empatar ou perder. A vitória custa prêmio extra. O treinador leva uma banana para escolher entre dois esquemas: 4-4-2 ou 3-5-2. É barbada. Falcão vai botar time faceiro. Pode se consagrar ou dar vexame. Ou alcançar 56% de aproveitamento. Uau!

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De lá para cá, Muricy ganhou uma Libertadores da América.

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O aproveitamento de Falcão no Inter foi de 50,87%.

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Equivalente ao meu.

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Renato foi embora do Gêmio

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Por uma questão de simetria, Falcão não durou.

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Quem sabe, sabe...

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O resto é resultado.

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