Michel Houellebecq, o homem livre
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Michel Houellebecq é o melhor escritor da atualidade entre todos os que eu li. Li muita gente. Não li todo mundo. Li grandes nomes. Admiro Vargas Llosa. Gosto mais de Houellebecq. Cheguei a uma conclusão paradoxalmente bizarra: não gosto de literatura. Gosto da vida em livros. Quando sinto cheiro de literatura, trato de fugir. O cheiro da vida em obras de ficção pode ser desagradável, mas traz o fascínio da verdade, que pode ser fantasiosa ou até de ficção científica. Noto a dificuldade da crítica acadêmica para entender a obra de Michel Houellebecq, um condensado de ironia e provocação sem floreios verbais. Michel não é realista nem experimental. O que é?
Não encanta o escritor oficineiro. Em geral, aborrece os que amam Joyce e Guimarães Rosa com seus neologimos ou expressões locais. O mesmo tende a acontecer com que os fãs de Clarice Lispector e Caio Fernando Abreu. Michel não produz frases que funcionem no twitter. Não revela a profundidade aparente das fórmulas que cabem em agendas ou em epígrafes. É outra coisa. Machuca. Incomoda. Faz mal. Eu invejo Michel Houellebecq. Ele é um homem livre. Eu não sou. Introduzi a obra de Michel no Brasil com Partículas elementares e Extensão do domínio da luta. Ele ganhou o seu maior prêmio, o Goncourt, Nobel francês, com O mapa e o território. Hoje, ele é conhecido mundialmente por Submissão, que deveria ter sido lançado no dia do atentado terrorista contra o jornal satírico francês Charlie Hebdo.
O que tem de fascinante nos livros de Michel Houellebecq? Eu poderia até dizer: não sei. Algo mágico. Um enigma. Um mistério. Nem sempre conseguimos explicar nossas paixões. Arte tem disso: não entrega sua chave. Por que a Mona Lisa é tão fascinante? Muita gente fica com a aura. Não entra sozinho no mistério. Eu poderia também dizer que Michel tem a capacidade de captar o essencial da nossa época enquanto outros tratam do próprio umbigo ou fazem narrativas para agradar colegas e ganhar pequenos prêmios que consolam das poucas vendas. Tudo isso é verdadeiro. Há mais. O que é esse mais?
Vou provocar muxoxos e outras coisas: Michel junta a clareza do jornalista com a capacidade de teorização do cientista social. Não se constrange em mesclar ensaio, fábula, autobiografia, observação da realidade, polêmica e opiniões fortes. A academia ainda vai levar uns 50 anos para entendê-lo. Dificilmente ele ganhará o Nobel, não por falta de talento, mas por não ser politicamente correto. Maldito. Como um discípulo de Guy Debord, Michel Houellebecq escreve para perturbar a sociedade.