Ministro da Fazenda, pior emprego

Ministro da Fazenda, pior emprego

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Vale a pena ler “O pior emprego do mundo – 14 ministros da Fazenda revelam como tomaram as decisões que mudaram o Brasil e mexeram com o seu bolso” (Planeta), de Thomas Traumann. Jornalista, o autor assessorou Antonio Palocci, Dilma Rousseff e Henrique Meirelles. Entrevistou os ministros de que trata o seu livro: de Ernane Galvêas e Delfim Neto a Meirelles passando por João Sayad, Zélia Cardoso de Mello e FHC. Durante parte do regime militar o poder sobre a economia ficou com o Planejamento.

O leitor encontrará muitas anedotas divertidas. Conhece a Doutrina Costa e Silva? É simples: quando Roberto Campos propôs ao ditador a autonomia do Banco Central, recebeu como resposta: “O guardião da moeda sou eu”. Conhece a lei MHS? Mario Henrique Simonsen, que seria sócio do Banco Bozano, foi ministro de Geisel. Ele formulou esta “lei”: “Todo projeto com dinheiro público envolve uma comissão. Às vezes, a obra só existe para alguém receber a comissão. Nesses casos, é mais barato pagar logo a comissão e não fazer obra nenhuma”. Era um eufemismo para propina.

Para ser ministro Simonsen ganhou um superministério. Para arrumar o Brasil, pediu licença para uma recessão de um ano e meio ou dois. Era desbocado. Chamou de “Bostabrás” a ideia de César Cals, ministro das Minas e Energia, de explorar o gás liberado pelo esterco. Contava em “andreazzas” os gastos que lhe pareciam absurdos propostos por Mário Andreazza. Este, garantia que Simonsen entendia muito de aço e nada de gente. Era um tempo de papo reto. Figueiredo perguntou a Simonsen: “Você acha que meu governo está uma m? Não obteve resposta. O ministro pediu as contas, voltou para o Rio de Janeiro e foi para a praia. Acossado pela imprensa, deu entrevista de sunga. Apertado, recorreu ao humor do soprano vaiado: “Vocês ainda não ouviram o barítono”. O barítono atendia pelo nome de Delfim Netto.

Convidado por João Figueiredo para substituir Simonsen, Ernane Galvêas ouviu esta consideração do último ditador: “O Geisel fez um pinto botar um ovo de avestruz. Vá lá e costura o pinto”. Delfim Netto também não usava subterfúgios. Ia direto ao ponto: “O Geisel era honesto, decidido, mas tinha uma pretensão... achava que era matemático porque sabia calcular o seno de 30 graus”. Parafraseando outro, era só um militar falando de economia. Delfim ficou célebre também por esta pérola: “Nunca fiz manipulação de preços. Só de oferta”. Transferia produtos de um lugar para outro de modo a interferir no cálculo da inflação medida no Rio de Janeiro.

Simonsen era fogo. Perguntado sobre o II PND, o grande Plano Nacional de Desenvolvimento, menina dos olhos de Geisel, respondeu: “Não leio ficção”. Delfim falava a linguagem do mercado. De volta ao topo, depois de um exílio dourado em Paris, discursou: “Senhores, preparam seus arados e suas máquinas, nós vamos crescer”. Por que mandar na economia seria o pior emprego do mundo? Um ministro da Fazenda, destaca Trautmann, controla dezenas de índices. O presidente só um: o da sua popularidade. Paulo Guedes, que vem do Bozano e terá superministério, que não bobeie. Ser ministro da Fazenda é tão ruim que todo mundo quer.

 

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