O golpismo e a guilhotina moderna
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Vovelle cita uma cançoneta popular interessante: “O deputado Guillotin/em arte médica/muito capaz e astucioso/fez uma máquina/para expurgar o corpo francês/de todas as pessoas com ideias/É a guilhotina, olé/É a guilhotina...” No Brasil contemporâneo, a guilhotina é o impeachment. Não que o impeachment corte cabeças de gente com ideias. Collor nunca teve uma só. Dilma Rousseff anda em busca de uma que a salve da máquina dos deputados Guillotin. O fantasma que a assombra talvez seja o da Rainha de Copas, de Alice no país das maravilhas, gritando “cortem-lhe a cabeça”. Não era Dilma que tinha fama de rainha destemperada? A maior certeza do cidadão atual é que, na política, não tem roubo sem a conivência do chefe.
O impeachment está previsto na Constituição, mas não para satisfazer a ira da Rainha de Copas (a oposição? O senso comum?) por qualquer razão ou sem razão alguma. Precisa uma justificativa jurídica, um crime de responsabilidade. A prova de que essa prova ainda não foi encontrada para acionar a guilhotina e destituir Dilma da sua cabeça já perdida é o entusiasmo da oposição com o pedido de impeachment de Dilma feito por Hélio Bicudo, jurista e ex-petista. O que tem a demanda de Bicudo que não têm os outros 21 requerimentos para transformar a presidente em Maria Antonieta pós-moderna? Nada. Salvo o fato de ter assinatura de Hélio Bicudo. A sua legitimidade vem não da apresentação de provas, mas do famoso “quem está dizendo o quê”. Não cabe falar da possível simetria entre Bicudo e tucanos.
A guilhotina do impeachment não é um instrumento de recall contra a incompetência de governantes. Vovelle diz que a guilhotina “estava para o massacre como o Terror estava para a violência espontânea”. A guilhotina assumiu o papel de ferramenta da violência institucionalizada. O ritual que ela exigia antes de cair sobre qualquer cabeça tornou-se cada vez mais sumário. Havia pressa. Os revolucionários tornaram-se rainhas loucas gritando: cortem a cabeça. O impeachment sem crime de responsabilidade é uma guilhotina sem ritual ou a violência “espontânea” das oposições contra as ideias ou falta de ideias de quem está no poder. Na Revolução Francesa, o “guilhotinador” de um dia foi guilhotinado no outro.
Será o PT um Robespierre a caminho do patíbulo onde pagará pelo terror que gerou?