O RS em clima de faroeste

O RS em clima de faroeste

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Existem muitas maneiras de questionar certas coisas: toda estratégia é legítima? Todas essas maneiras acabam resumidas na velha pergunta: os fins justificam os meios? A simples formulação do questionamento parece dar a resposta. Não.

Há quem, entretanto, considere que, em alguns casos, deve-se responder afirmativamente. Encontrei uma nova forma de fazer essa pergunta: a política é uma atividade moral? Sei que tem algo de exagerado nessa proposição. Mas, diante das artimanhas que integram o arsenal dos políticos, não é tão despropositado assim arriscar. Se um governante tem uma possibilidade de obter recursos emergenciais para pagar o funcionalismo e não o faz a tempo, o que se deve pensar?

Se um governante, num momento de crise profunda, transfere dinheiro disponível para uma conta de pagamento de juros questionáveis ao poder judiciário, o que se deve concluir?

O Rio Grande do Sul vive uma das suas maiores crises. Sente-se isso nas ruas. A violência dispara. O policiamento é escasso. O medo prospera. Sair de casa à noite só depois de tomadas medidas de precaução e de traçado um minucioso plano de ação levando em conta o percurso, o número de pessoas nas ruas e as possíveis rotas de fuga. Relatos de infortúnio se tornaram corriqueiros. Ainda não ter sido assaltado é quase uma provocação às estatísticas. Quem recebeu apenas R$ 600 de salário se desespera. Teve gente pedindo esmola, implorando ajuda aos parentes, deixando de pagar aluguel ou atolando-se em multas e nos juros dos cartões. Em muitas mesas, falta comida. Isso podia ter sido evitado? Os elementos disponíveis indicam que sim.

Se é preciso descumprir uma lei, entre duas possíveis, qual deve ser escolhida?

Não pagar os salários de quem cuida da segurança pública, da saúde e da educação ou atrasar o repasse que permite o pagamento dos auxílios privilegiados da magistratura e do Ministério Público?

É moral apostar numa estratégia política que semeia o caos e leva o pânico à população? É legítimo usar a fragilidade da população como fator de pressão sobre os deputados que recebem seus salários integrais em dia? Se provado que tudo isso é uma estratégia, o governo poderia ser responsabilizado judicialmente pelos prejuízos causados aos indivíduos? Se o governo atrasa o salário, levando João a não pagar o seu aluguel, sendo penalizado com multas, seria o caso de João recorrer à justiça por indenização? A justiça acolheria? Eu me pergunto sinceramente: atrasar salários, havendo qualquer remota possibilidade de evitar tal desatino, não caracteriza um crime de responsabilidade? Diminuir o policiamento nas cidades, deixando as pessoas à mercê dos bandidos, não é outro crime de responsabilidade?

Não seriam os três poderes e o Ministério Público corresponsáveis pela situação de calamidade a que o Rio Grande do Sul se encontra exposto? Não poderiam ser acusados de cumplicidade em crime premeditado? Não cometerei o excesso de falar em formação de quadrilha. Quando pergunto, não sei mesmo. A estratégia parece evidente.

Quem se responsabilidade por ela?

Quem paga, está claro.

Enquanto pensa na resposta, o governo deixa o Estado em clima de faroeste.

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