Os seios de Kate e a liberdade de imprensa

Os seios de Kate e a liberdade de imprensa

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Toda hora me perguntam, por eu ser professor e um dos maiores intelectuais do Brasil, se deve existir um limite à liberdade de imprensa. Como tenho cérebro de ervilha, nunca sei a resposta exata. Fico dividido. A mídia não gosta que ponham limites aos seus interesses. Acha que só ela pode impor limites aos outros. Pois o caso das fotos da princesa Kate Middleton me deu a resposta: nenhum veículo tem direito de publicar imagens da vida privada sem qualquer interesse público. Nada justifica a divulgação das fotos da moça com os seios de fora num ambiente absolutamente privado. É sacanagem. Só.

Espero que a revista seja condenada e tenha de pagar um caminhão de dinheiro de indenização. Tenho horror de reis, rainhas, príncipes e princesas. Acho isso um negócio brega, inútil e anacrônico. Não consigo conceber um só cargo público transmitido hereditariamente. Nada disso muda minha posição sobre a publicação das fotos de Kate por uma revista francesa bagaceira. Kate é uma gata. Liberdade de imprensa é um tabu. Basta falar em algum limite para que a gritaria comece: censura! Sou contra qualquer exame prévio. Se o veículo quer publicar, que o faça. A justiça é que deve pesar a mão. A condenação precisa ser implacável, impiedosa, acachapante. É claro que não falta público para isso.

Tem um bando de onanistas louquinhos por esse tipo de material cretino.

O diretor da revista italiana do mesmo grupo, que promete também publicar as fotos, tentou justificar: "É um caso que merece ser tratado, porque mostra de forma muito natural a vida diária de um casal apaixonado famoso, jovem e moderno", explicou à imprensa Alfonso Singorini”. Conversa fiada. As fotos foram feitas com teleobjetivas. Espionagem vagabunda, invasão de privacidade, exploração do corpo feminino como alimento para tarados, voyeurs, barbados na seca e por aí vai. Que tempos! Em Nova York tem um bar que deixa o traseiro dos clientes, no banheiro, à mostra. Tem quem goste e ainda abane para a plateia. A princesa Kate não faz parte desse time. Não estava em ambiente público. Não autorizou nem se autorizou.

Foi assaltada na sua intimidade. Ponto.

Esse é mais um exemplo da lógica da passagem ao hiperespetacular na “sociedade mídiocre”. O fim da privacidade, da intimidade e da possibilidade de evacuar em ambiente fechado. Tudo por dinheiro. Tudo para satisfazer os instintos mais baixos do soberano, o público. Na época em que uma moça, princesa ou não, perde o direito de bronzear os seus seios no pátio de casa sem correr o risco de ver exposta numa revista de fofocas, nada mais está ao abrigo, nem o bumbum de quem vai ao banheiro expulsar a cerveja do bar. Cada um mostra o que quer ou que tem. Mas, como no caso da pirataria na internet, o que se deseja mesmo é poder tomar o que não se tem direito de pegar, a autonomia individual, o último reduto de opacidade. A transparência, mais uma vez, é confundida com visibilidade. As paredes estão condenadas.

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