Que tiro foi esse?

Que tiro foi esse?

publicidade

 Tá causando muito.

Jojô Todynho mandou bem.

Tem gente torcendo o nariz. Durante muito tempo, muito tempo mesmo, a ordem era educar a periferia para ouvir a arte da elite. A ideia nunca decolou. Não tinham combinado com os russos. Os romanos dominaram a Grécia. Os gregos helenizaram Roma. A batida é essa, mermão! Gonzagão tocava música europeia para tentar ganhar uns cobres. Para ele mesmo soltava o Nordeste que carregava nas entranhas. Foi aí que lhe disseram: toca uma das nossas, vai! Nunca mais parou. A periferia tem criatividade. O centro pira. Jojô acertou o tiro com sua estética funk labiríntica.

O centro não é mais centro no sentido tradicional.

Na era das redes, o centro pode estar em toda parte. Os youtubers fazem sucesso sem precisar ir ao Jardim Botânico. O centro parasita a periferia para surfar na onda das novidades. Mas o centro existe. É só olhar os dados da Oxfam: “cinco indivíduos possuiriam o mesmo patrimônio que os 50% mais pobres da população (cerca de 100 milhões de brasileiros)”. Esses caras enriqueceram no batente, suando ou cansando a caraminhola? Não necessariamente. “O relatório global da Oxfam aponta que cerca de um terço das fortunas dos bilionários do mundo provém de heranças ou de relações clientelistas entre empresários e governos”. Deu ruim, né?

A periferia quase não sai do seu labirinto. Quando sai, bota meio mundo na roda e choca a outra metade. Jojô Todynho é muito musa. Vai durar uma estação e evaporar? Tudo passa. Charles Baudelaire e Walter Benjamin já sabiam disso. Googlemos! O samba foi feito no morro. A Zona Sul entrou com a Bossa Nova. Depois, foi para Miami. Ou andar de metrô em Paris. Agora quem manda é o funk. Passa do ponto? Quem não deixa o leite virar? Quem não quebra copo? Quem nunca bebeu além da conta e saiu sem pagar? Que tiro foi esse? Não é bala perdida. É o som de quem estava escalado só para ser figurante e limpar o cenário. O mundo mudou.

Todo mundo virou dono de meio de comunicação.

Amei Jojô Todynho. Que entrada em cena.

De Bangu para as redes. Da carrocinha de cachorro quente para o sucesso sem food-truck. É fo...go. Para os críticos Jojô mandou este recado: "Vamos acabar com o mimimi. Vamos parar de gracinha? Primeiramente, não fale o que você não viveu dentro de uma comunidade. Entendeu? Eu jamais faria uma música incitando, incentivando a violência. Aprendam a traduzir as coisas". Para os lentos, meteu o pé: “Todo mundo sabe que a música "Que tiro foi esse?" é aquela coisa: "Caraca! Essa roupa está linda! Que tiro, desmaiei, está lindo esse cabelo’”. Calou a boca da TFP.

Como dizia alguém, certa noite, o vento leva as velas para longe, mas traz para perto os fogos da criação, que duram o tempo de labaredas se consumindo na emoção do gozo imediato. Não entendi bem o que queria dizer, pois estava em chamas, mas gostei da intensidade do incêndio. Ou entendi muito bem e me fiz de desentendido para não racionalizar o que era pura intuição.

Que tiro foi esse? Foi Jojô.

*

Que tiro foi esse?

Juízes que ganham auxílio-moradia podem ser os mesmos que mandam despejar pessoas que ocupam prédios públicos inúteis por não ter onde morar.

*

O juiz Marcelo Bretas, que mora com a mulher juíza em apartamento próprio em bairro nobre, ganhou na justiça, contra norma da própria justiça, o privilégio de também receber auxílio-moradia. Um auxílio para cada membro do casal. Ele alega que a lei não pode tratar de forma díspar membros de uma mesma classe. Dois problemas lógicos. 1) Ele pertence segundo a lei a uma subclasse (a dos casados, que habitam uma mesma moradia). Por fim, ele pertence à mesma classe dos cidadãos brasileiros, que são tratados de forma díspar e não têm essa teta generosa chamada auxílio-moradia até para quem tem casa na praia, na montanha, na cidade, no campo e para alugar.


*


Lula até pode ter sido condenado sem provas, mas não sem culpa.


*

Quem recebe benefício indevido com dinheiro público é indecente

Segundo a justiça, Lula recebeu benefício indevido com dinheiro público

Logo Lula é indecente?

*

Não se deve falar com gente indecente

Para a justiça Lula é indecente

Logo não se deve falar com Lula?

*

A justiça de Curitiba diz que o triplex é do Lula.

A de Porto Alegre também.

A de Brasília diz que é da OAS.

A de Curitiba e de Porto Alegre veem nisso a prova de que é do Lula.

A OAS seria laranja do ex-presidente.

A prova da prova é falta de prova.

*

A juíza de Brasília aceitou o triplex em penhora de dívida da OAS.

Especialistas explicam que ela não poderia fazer diferente.

A juíza afirmou: “Importante esclarecer que cabe ao credor, e não ao Judiciário, a indicação do débito e bens do devedor que serão penhorados e responderão pelo pagamento da dívida, conforme o atual Código de Processo Civil”.

Não é preciso provar que o credor seja dono do bem indicado?

Logo, posso indicar o Palácio do Planalto para penhora de uma dívida de que eu seja credor de meu vizinho?

*

Leigo faz cada pergunta.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895