Quem tem medo de vacina?

Quem tem medo de vacina?

Obscurantismo versus ciência

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      O leigo acha que científico é o irrefutável. Depois especialmente de Karl Popper (1902-1994), científico é aquilo que é passível de refutação. Ou seja, discutível. Em ciência, portanto, tudo é discutível. Só que para reabrir uma discussão é necessário ter evidências aceitas por quem define o que o é científico: os cientistas. Tem gente defendendo que a Terra é plana. Pode discutir. O problema é que não há evidências plausíveis de que seja assim. O mundo da ciência é fascinante e avesso a dogmas. Vive-se de hipóteses, de teorias, de experimentações, de comprovações e de refutações. Ninguém é dono da verdade. Existe um movimento antivacina. Há quem serve isso? O que seria da humanidade sem as vacinas que nos protegem de tantas doenças?

      Interessa saber de onde vem uma vacina ou se ela é segura e eficaz? Quem tem medo de vacinas? Se eu não me vacino, prejudico só a mim ou, no caso de doenças contagiosas, posso prejudicar terceiros? O principio do dano, sustentado pelo grande liberal John Stuart Mill, deve ser invocado para obrigar todo mundo a se vacinar? Se eu não me vacino, no exercício da minha liberdade, cabe ao outro se vacinar para não ser atingido por mim? Logo, a responsabilidade é dele? Não crer na eficácia das vacinas passa por descrer da ciência. O lema kantiano iluminista era “ousa saber”. O conhecimento ilumina. O saber acumulado ao longo dos séculos já permite ter confiança na ciência. Basta pensar em como era a vida antes da descoberta científica dos antibióticos.

      Outra possibilidade de interpretação é esta, a da aposta: se não me vacino, o que ganho? O que perco? Se me vacino, tenho chance de me proteger do perigo de acordo com o grau de segurança e eficácia descrito pelos cientistas. Se não me vacino, escapo de algum efeito colateral da vacina e fico exposto ao patógeno. Uma mãe amorosa e responsável deve ou não vacinar seus filhos contra o sarampo? Ela pode, em nome da sua liberdade, deixar uma criança exposta ao perigo? Em caso de doença, torna-se responsável pelo acontecido por negligência? Da mesma forma, é legítimo recusar uma vacina ou medicamento que possa ser eficaz em função da sua procedência? Ou é isso que se chama de ideologia? Salvo, claro, se existirem alternativas equivalentes.

      Somos complexos e confusos. A sociedade decidiu que se deve multar quem não usa cinto de segurança dentro de um carro em movimento. Há quem veja nisso um abuso por ver diminuto risco de dano a terceiros. Se pode punir por não usar cinco de segurança, por que não poderia obrigar a tomar uma vacina capaz de dar proteção a si e aos outros? O argumentador atento dirá que usar o cinto não introduz risco algum. Até nisso pode haver controvérsia. O que dizem os resultados? Em princípio, que os ganhos são muitos maiores. A sociedade tem o direito de proteger um indivíduo de si mesmo. No caso da vacina contra o coronavírus, ter de obrigar alguém a ser proteger parece bizarro. O principal argumento deveria o do dom bom senso. Outro nome que se dá ao medo de morrer.

 


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