Queremos Lula?

Queremos Lula?

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“Ele disse”

 

A história do Brasil parece se repetir sem cerimônia. Em 1945, o país conheceu o movimento “queremista”. Retumbava o “queremos Getúlio”. Defendia-se uma constituinte com Vargas antes das eleições presidenciais. Não rolou. Getúlio foi derrubado. Continuou extremamente popular. Estamos vivendo hoje um retorno do queremismo? Getúlio refletiu no seu isolamento e, contrariando suas convicções, resolveu influenciar o resultado das eleições. Depois de receber, em São Borja, uma visita do seu correligionário Hugo Borghi, deixou escapar o conselho que se tornaria o slogan vitorioso: “Votai em Dutra”. Os eleitores obedeceram.

Getúlio considerava Eurico Gaspar Dutra um golpista. O militar dera aval à queda do seu benfeitor. A mensagem de apoio ao traidor só chegaria meia hora antes de terminar o último comício de Dutra. “O candidato do PSD, em repetidos discursos, e ainda agora, em suas últimas declarações, colocou-se dentro das ideias do programa trabalhista. Ele merece, portanto os nossos sufrágios!” Vargas, porém, reservou-se um direito posterior de oposição: “Estarei ao vosso lado e acompanhar-vos-ei até a vitória. Após esta, estarei ainda ao lado do povo contra o Presidente, se não forem cumpridas as promessas do candidato".

O conselho de voto de Getúlio vinha de uma profunda reflexão: “Agredido, injuriado, traumatizado pelo choque dos ódios e das paixões políticas venho dizer-vos que esqueci tudo e encontrei no amor pela minha pátria forças para me renovar. Estou presente e venho cumprir a minha palavra”. O que fará Lula? Sairá da prisão para ser candidato? Emergirá da sua cela como um Getúlio do século XXI superando as agressões, as injúrias, os traumas, os choques de ódio e as paixões políticas para, renovado, recomendar, por amor à pátria, o voto no candidato possível? Getúlio sustentou sua posição com pragmatismo: “A abstenção é um erro. Não se vence sem luta, nem se participa da vitória ficando neutro. Fora do governo, meu espírito sofreu a decantação de quaisquer ressentimentos por injustiças sofridas”. Lula fará o mesmo?

Leitores dirão que é absurdo comparar Getúlio e Lula. Vargas, sobre a realização das eleições, garantiu: “Nunca pretendi outra cousa senão cumprir a lei”. Sobre a sua queda, conciliou: “As ocorrências de 29 de outubro foram o resultado de erros e confusões das quais nos devemos dar quitações mútuas”. O impeachment de Dilma Rousseff será o resultado de erros e confusões mútuas? Impossibilitado de concorrer à presidência, mas não a outros cargos, Getúlio ponderou: “O momento não é de homens, mas de programas e de princípios”. Depois de mandar “cerrar fileiras” atrás do programa do PTB, decidiu apostar no candidato do PSD, seu ex-ministro. Fará Lula o mesmo na última hora? Quem será o Borghi a convencer Lula? Quem será o Dutra de Lula? O governador do Maranhão, Flávio Dino, do PCdoB, defende apoio a Ciro Gomes.

Com Haddad na vice?

Ou com Manuela? Os dias passam. O que pensa Lula na solidão? Quando virá o seu “ele disse”? Na sua mensagem, Getúlio observou: “As forças armadas do Brasil devem estar acima das suspeitas facciosas e não podem ser consideradas em causa em lutas partidárias”.

Ele disse muito.

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