Revolução jornalística em 1895

Revolução jornalística em 1895

Correio do Povo, 126 anos

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Cada época cria o seu imaginário? Cada imaginário produz a sua época? Ou cada época cria o imaginário que a produz? O jornal Correio do Povo, cuja primeira edição circulou em 1º de outubro de 1895, é o fruto puro do imaginário da sua época, o final do século XIX. Começar dessa maneira não falta com a verdade, princípio que tem norteado a existência do jornal mais tradicional da história do Rio Grande do Sul, mas omite outra verdade, mais sutil e menos factual: o Correio do Povo foi o primeiro jornal gaúcho do século XX. Esse é o ponto.
Por que um homem decide lançar um jornal? Em 1895, essa pergunta não surpreendia, mas revelava a ousadia do empreendedor e fazia pensar sobre a natureza e a duração da aventura. Ainda mais que o projeto de Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior se anunciava como diferente de tudo o que os gaúchos estavam acostumados a ver em matéria de jornalismo. O impresso era o centro de tudo. A era do rádio ainda estava distante. A invenção da televisão não era notícia nem como ficção científica. O espaço público ampliado tinha nas páginas dos jornais a sua realidade palpável. Assinar um artigo num jornal era projetar a voz num alto-falante e tomar lugar numa tribuna reservada aos homens de ideias. A tentação de ser dono de jornal atingia principalmente os indivíduos com aspirações políticas ou com tendência para o reformismo social ou para a pregação de qualquer ordem.
Havia fartura de jornais e de ideologias na Porto Alegre de 1895: A Federação, porta-voz do PRR, polemizava desde 1884 com quem ousasse discordar do republicanismo de Auguste Comte e de Júlio de Castilhos, não necessariamente nessa ordem, mas especialmente de trás para frente. O positivismo de Comte, administrado por Castilhos e difundido por A Federação, era uma religião laica, uma crença quase irracional nos poderes emancipadores da razão, uma verdade vespertina repetida com ênfase, persistência e grande capacidade de insulto.
Caldas Júnior não queria ser político nem advogado, algo raro num jornalista da sua época. Ambições, porém, não lhe faltavam. Em comum com outros jornalistas ele tinha o gosto pela poesia. Publicaria, em 1913, ano da sua morte precoce, os seus Versos escolhidos. Aos 27 anos de idade, na conturbada república do visceral Júlio de Castilhos, ele estava pronto para fazer e contar história. A sua experiência no jornalismo passava pelas funções, por robustos três anos, de revisor e noticiarista (uma mistura de repórter e de redator de notícias) em A Reforma, do qual seria, depois, diretor até a interrupção da sua circulação, em 1892. Depois, daria o grande salto.
O Correio do Povo veio à luz, numa terça-feira, com quatro páginas, como era comum, de 39 por 56 centímetros, divididas em seis colunas, impresso, em papel importado da Europa, numa modesta máquina Alauzet, com redação na Rua dos Andradas, 132, e uma tiragem de dois mil exemplares à base de 400 exemplares por hora. Nunca mais o jornalismo gaúcho seria o mesmo. Falo disso tudo em meu livro “Correio do Povo, a primeira semana de um jornal centenário”. Grande jornal.

 


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Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895