Robinho, pedalando na vida

Robinho, pedalando na vida

Jogador ataca feminismo depois de condenado por violência sexual contra mulher

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      Excelente jogador de futebol, famoso por suas pedaladas, Robinho está patinando na vida. Condenado, na Itália, em primeira instância, por violência sexual contra uma jovem albanesa, ele tenta fazer crer que nada fez de infame ou de ilegal. E isso já é parte da infâmia dos atos de violência cometidos por homens. O telefone do atleta, porém, foi grampeado e as conversas ouvidas mostram que o seu caminho é o de uma prisão, possivelmente brasileira, se as melhores relações internacionais forem consideradas. Robinho acredita que o seu único pecado foi ter traído a esposa. Há pouco, o atacante acertou para voltar ao seu clube de origem, o Santos. As críticas foram tantas, com desistência de patrocinador, que o clube paulista teve de recuar.

      Não bastasse o ato em si, com a condenação derivada de um processo legal amparado em provas, Robinho vomitou uma frase para os anais do machismo verde-amarelo: “Infelizmente, existe esse movimento feminista. Muitas mulheres às vezes não são nem mulheres, para falar o português claro”. Falou o machismo claro. Junto, nas entrelinhas, uma dose de homofobia. O feminismo apavora muito macho acossado por seus feitos e defeitos. Robinho entende que só há violência sexual se houver penetração não consentida. O resto, na sua vã filosofia, pode. Pratica o trivial “ela provocou”. Alguns dos grandes males do Brasil são, muito além da saúva, de saudosa memória literária: desigualdade, racismo, machismo, homofobia, dinheiro na cueca, fanatismo, extremismo.

Por trás de quase todo crítico feroz do politicamente correto, que pode ter seus excessos, costuma esconder-se muitas vezes, sem grande dissimulação, um defensor de privilégios indevidos ameaçados. Pelo jeito, para Robinho, como para muito cara que se acha dono da bola, “não” ainda pode ser “sim” e inconsciência pode valer como consentimento. O jogador não compareceu a qualquer audiência para se explicar ou defender. Seguiu em frente como nada houvesse. Nos áudios revelados pela justiça, pode-se ouvir este diálogo nada edificante de Robinho com um músico que não participou da “ação” coletiva:

Jairo: “Eu te vi quando colocava o pênis dentro da boca dela”.

Robinho: “Isso não significa transar”.

         Não é questão de politicamente correto. É algo, ao mesmo tempo, mais palpável, nefasto e moralmente contundente. No imaginário masculino, com frequência, o corpo feminino continua a ser objeto passível de apropriação a qualquer momento. Desconsiderada como sujeito, a mulher aparece sem vontade. Na escravidão, o corpo das escravizadas podia ser usado a bel-prazer pelos seus donos. A frase de Robinho sobre o feminismo pode ser vista como um sintoma dessa dificuldade de considerar a vontade feminina. Se a mulher está ali, por que perder tempo pedindo-lhe autorização de “uso”, pois é disso que se trata na ótica do “usuário” desse corpo que vê como disponível? O feminino então é visto como uma afirmação de autonomia que despoja o macho da sua “liberdade” predatória. Daí a sua indignação. Já era.


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