"Tenemos" Papa, Messi e Maradona

"Tenemos" Papa, Messi e Maradona

publicidade

A eleição de um papa é coisa muito séria. Mas a brincadeira também é abençoada por Deus. Pode um jesuíta argentino, com nome franciscano, reinar em nome da humildade e da modéstia? Não é paradoxo demais? O homem tem qualidades: gosta de tango, de Borges e de futebol. Não é muito para a Argentina ter Messi e o papa ao mesmo tempo? Não é abuso de poder? Ainda mais depois de Maradona ter ganho uma Copa do Mundo para os argentinos com ajuda, segundo ele mesmo, da “mão de Deus”! Os adversários de Cristina Kirchner sugerem que essa foi a única maneira encontrada em nível internacional para contrabalançar os poderes absolutos da viúva de Néstor.

Um papa sul-americano é uma grande virada. Mais uma marca destes tempos globalizados em que um negro comanda os Estados Unidos, um índio chefia a Bolívia e uma ex-guerrilheira governa o Brasil. É verdade que nós, brasileiros, estamos um pouco aborrecidos. Perdemos essa parada logo para os argentinos. Como a inveja é um sentimento feio, vamos engolir nossa decepção. A nossa consolação é repetir que Deus e Pelé são brasileiros. Os argentinos retrucam: “Há controvérsia”. Teve gente que achou que o novo papa era o Zagallo ou o filho de um fã constrangido do Velho Lobo. O homem se chama Jorge Mário. Zagallo é Mário Jorge. Brasileiros mais desbocados teriam ensaiado um coro: “Arg!, arg!, arg!, o papa é argentino”.

Para testar a infalibilidade papal setores nacionalistas argentinos gostariam de submetê-lo a um teste definitivo. Fariam uma única pergunta: “As Malvinas são argentinas ou britânicas?” A escolha de Bergoglio já está servindo para divulgar Borges e a literatura argentina. Se fosse um brasileiro, Machado de Assis poderia ficar mais conhecido no mundo. Se tivesse sido o gaúcho Dom Odilo, Erico Verissimo brilharia. Editores lamentam. Havia até um refrão prontinho: “Acha, acha, acha, um papa de bombacha”. Cantaríamos de peito aberto: “Que sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra”. Dom Odilo tinha um problema. Dividia o rebanho. É gremista.

Falando muito sério: como se sairá nosso sul-americano à frente dessa potência global? O mundo está analisando a sua ficha: conservador ou moderado? Comprometido com a ditadura argentina ou habilidoso protetor de alguns perseguidos? Fará algumas mudanças para, como desejam alguns, modernizar a igreja católica e dar mais transparência aos negócios do Vaticano? Vai tocar, contrariando alguns dos seus posicionamentos conhecidos, em temas tabus como celibato, preservativos casamento entre pessoas do mesmo sexo e ordenação de mulheres? Vai se preocupar com os pobres deste mundo?

O novo papa já escreveu livros sobre João Paulo II e Fidel Castro e sobre o holocausto. É um intelectual. De um argentino, assim como de um gaúcho, espera-se que goste de carne assada, não tenha, mesmo sendo Papa, papas na língua, seja de faca na bota e não leve desaforo para casa. Maradona saudou o novo papa com a sua proverbial modéstia: “O Deus do futebol é argentino, e agora o Papa também é”. Será que se referia a ele ou a Lionel Messi?

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895