Teoria do complô: golpe ou contragolpe?

Teoria do complô: golpe ou contragolpe?

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Li-Pen, se de fato existiu, dizia, há dois mil anos, que, quando há indícios suficientes de complô, uma conspiração deve estar acontecendo. Talvez em sentido oposto. Ou não. Li-Pen via longe. Dá para imaginar que o mundinho de Brasília não se encontre em coquetéis, banheiros de palácios e cerimônias oficiais? Dá para pensar que não cochicham e fazem combinações? Fala-se num acordão (que pode virar um acórdão) para salvar Dilma do impeachment. Eis as pistas. Rodrigo Janot precisava de Dilma para ser reconduzido ao cargo de procurador-geral da República. Dilma precisava de Janot para, com uma denúncia de corrupção, neutralizar o seu principal adversário, Eduardo Cunha, presidente da Câmara de Deputados. Feito.

Dilma indicou Janot, que denunciou Eduardo Cunha. A confirmação de Janot no cargo depende do Senado, que tem senadores investigados, inclusive, além do famigerado Fernando Collor, o presidente da casa, Renan Calheiros, réu desde 2015 numa ação civil e objeto de investigação no STF desde 2013. Renan caminhava para o quinto dos infernos. De repente, guinou à esquerda. Aproximou-se do Planalto. Fugiu da planície. Virou fiador de Dilma. Vai levar o Senado a aprovar o nome de Janot. Ninguém pede a saída imediata de Renan. Eduardo Cunha, então, está certo: há uma conspiração contra ele? Ou ele faz parte de uma conspiração junto com setores do PMDB e do PSDB para derrubar Dilma? Contra o golpe de Cunha, um contragolpe de Dilma? O empresariado e a imprensa internacional aderiram a Dilma e parecem determinados a impedir a sua queda.

Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco, comentou a possibilidade de impeachment: "Pelo que vi até agora, não tem cabimento. Pelo contrário, o que a gente vê é que Dilma permitiu uma investigação total sobre o tema". Setubal disse também que as tais pedaladas fiscais não são motivo para derrubar presidente. Já Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, cutucou a oposição: "Pessoas precisam ter a grandeza de separar o ego pessoal do que é melhor ao país". Os jornais estrangeiros seguem no mesmo tom. Segundo o Financial Times: se Dilma cair, “será provavelmente substituída por outro político medíocre que tentará implementar as mesmas políticas econômicas". O New York Times foi mais longe: “Em toda essa turbulência, é fácil não ver a boa notícia: a força das instituições democráticas brasileiras. Ao processar a corrupção na Petrobras, os promotores federais de uma unidade especial anticorrupção do Ministério Público não foram dissuadidos por posições hierárquicas, aplicando um golpe na forte cultura da impunidade entre as elites do governo e empresariais”.

O editorial do NYT golpeou: “Embora as investigações tenham criado enormes problemas políticos para Rousseff (...) ela, admiravelmente, não se esforçou para constranger ou influenciar as investigações”. No Brasil, um dos expoentes da ditadura, o ex-ministro Delfim Neto, recorreu à ironia para falar das passeatas brancas de 16 de agosto: “Panelaços em bairros elegantes e gritaria no Congresso podem revelar o mau humor da sociedade, mas não são as provas materiais de que precisam os que querem protestar e podem fazê-lo porque protegidos pela democracia mas, que no fundo, desconfiam dela”. Que petardo!

O economista Luís Carlos Bresser Pereira, ex-ministro de FHC, disparou contra o ninho tucano: “Este não é o momento para atacar o governo. Muito menos é o momento para tentar desestabilizá-lo. Não estamos em época de eleições, mas em um momento em que temos que reunir forças para enfrentar uma crise econômica”. Complô? Gilmar Mendes, ministro do STF, pediu à Procuradoria-Geral da República, comandada por Janot, que investigue possíveis ilegalidades nas contas da campanha de Dilma. Gilmar faz parte do golpe? Janot, do contragolpe? Se ficar provado que dinheiro ilícito entrou na campanha de Dilma, a queda será inevitável, necessária, incontestável e devastadora. É tudo que se precisa para ter impeachment sem golpe.

O Datafolha examinou os dados das manifestações recentes contra e a favor do governo. Conclusão: carecem de representatividade social e demográfica. São predominantemente passeatas de homens brancos com curso superior ou, no outro lado, de funcionários.

Eis: “Nas pesquisas realizadas pelo Datafolha nas últimas manifestações de São Paulo, a maioria dos entrevistados tinha nível superior de escolaridade (76% entre os da Paulista e 52% no Largo da Batata). Na população paulistana, essa taxa corresponde a 28%. Nos dois eventos, a presença de homens era maior do que a média em mais de dez pontos percentuais”.

Cooptados para golpe e contragolpe?

Os mais recentes cooptados seriam Barack Obama e Angela Merkek, que não estariam dispostos a reconhecer golpistas.

Li-Pen confirmaria a sua hipótese.

Ele teria sido o primeiro a dizer que onde há fumaça, há fogo, salvo se a fumaça for uma cortina.

As grandes decisões podem ser fixadas ao pé do ouvido antes ou depois do hino nacional.

Ou na solidão dos mictórios.

 

 

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