Tipos que a gente encontra na vida

Tipos que a gente encontra na vida

Personagens que jamais têm dúvidas

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    Escritores do século XIX acreditavam na ciência literária e estudavam os caracteres das pessoas para compor seus personagens. A ideia era que existem tipos. Tenho alguns amigos e quase amigos assim. Quase amigos são aqueles conhecidos com quem mantemos uma relação ambígua, de alguma afeição e certo estranhamento. Falarei de três desses tipos que na linguagem de antes seriam rotulados de figuras impagáveis.
    O primeiro, que chamarei de A, é pessoa mais convicta que conheço. Ele chega, emite uma opinião e, se recebe uma resposta contrária ao que disse, repete a fala sem tirar nem por. Diante de nova refutação, repete palavra por palavra o que afirmou até vencer o oponente por cansaço.
– O mundo vai bem.
– Não acho.
– Estou dizendo, o mundo vai bem.
– Não é o que penso.
– O mundo vai bem, sei que concordas comigo.
    Outra técnica de A é fazer o criticado por ele admitir que a crítica é pertinente graças a uma astúcia retórica de sugestão:
– Sei que não deu tempo de fazer melhor – ele diz.
– Mas eu acho que ficou muito bom.
– Não, não, eu sei que não deu tempo de fazer melhor.
    Já B é conservador ao extremo. Respinga ideologia. Vive preocupado com o avanço do comunismo, com o politicamente correto e com os horrores da esquerda. Diante de qualquer observação ou argumento, dispara:
– Isso é ideologia.
– Mas só queremos algo justo...
– Ideologia, estou dizendo, pura ideologia.
    A personalidade de C é curiosa. Ele sempre se mostra afável. Fala manso, sem alterações na voz. Em qualquer situação, porém, cobra coisas acontecidas décadas antes. Lembra os comentaristas de futebol que defendem teses apaixonadas. Durante meses a tese afunda. Eles esperam até que um dia um resultado confirma a tese, até mesmo sobre a maior importância do desempenho, e eles voltam a se exibir triunfantes em público. Assim, nunca estão errados. O defensor de teses é como relógio parado, está certo uma vez por dia; a outra vez é erro metodológico. O bravo C tem algumas paixões tão intensas que vive para tentar enquadrar quem possa algum dia ter deslustrado a imagem dos seus amores e ídolos.
– Reconhece que não era aquilo...
– Mas faz cinquenta anos...
– Ainda dá tempo. Sei que pensas como todo mundo.
– Mas..
– Vi, te arrepende, tira esse peso das costas.
*

Personagem mesmo, dos grandes, foi Ton wolfe. Um tipo extraordinário começa pelas meias.

*
    Hiltor Mombach, nosso melhor comentarista de futebol, tem razão: só a volta do mata-mata trará emoção ao Brasileiro. Os pontos corridos só existem para dar trabalho e sustento aos clubes o ano inteiro. Mesmo a racional Europa se diverte mesmo é no mata-mata da Liga dos Campeões.

 


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