Um ar fresco vindo da Patagônia

Um ar fresco vindo da Patagônia

publicidade

Mais uma palhinha da melhor narrativa de viagem publicada no Brasil desde Tristes Trópicos. Modestamente, é claro.

*

“É o mundo pós-68, a ‘sociedade do espetáculo’”, teorizei, esvaziando mais uma taça de vinho argentino.

“Ah, não”, disse categoricamente Michel. “Foi o rock que mudou, para o bem ou para o mal, o mundo, não 68.”

Onde outros vêem a marca de maio de 1968, com as utopias dos estudantes sendo transformadas em realidades insuperáveis e necessárias, Houellebecq vê exclusivamente a ação revolucionária do rock, algo que me escapa por completo na medida em que não ouvi Beatles na adolescência, descobri Janis Joplin, Jimi Hendrix e a maconha com quase 20 anos de idade e só prestei atenção a uma música dos Rolling Stones quando eles fizeram um mega-show nas areias de Copacabana, no Rio de Janeiro, em 2006, quando eu já estava mergulhado na crise dos 40.

“Que música?”, perguntou Michel, visivelmente encantando com a minha ignorância sobre rock.

Eu sempre gosto de exagerar esse desconhecimento, de resto, quase total, para salientar o meu deslocamento neste mundo em que vivemos e para divertir meus amigos.

“Aquela, a mais famosa?”, gaguejei.

“Satisfaction?”

“Essa mesma, Michel. Essa aí...”

Michel começou a cantar. Não perdia muito em carisma para Mick Jagger, estrela que jamais o fascinou. Faltava-lhe, porém, a indumentária e o ar de cretino. Provoquei-o a tentar sorte no papel de John Lennon. Entre uma canção e uma imitação, inventamos um pequeno jogo. Imaginar o que estariam fazendo naquele momento gente como Bento XVI, Bin Laden, Mick Jagger e o Dalai Lama.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895