Um gângster no Jaburu

Um gângster no Jaburu

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Trata-se de um romance policial. Um “polar” como dizem os franceses. A trama é simples: um encontro na calada da noite no palácio do Jaburu, onde reside o presidente de uma república bananeira. O visitante, um empresário muito rico, entra dando nome falso e sem ser revistado. Carrega um gravador ligado no bolso do casaco. O presidente o recebe como um velho amigo. Conversam sobre assuntos escabrosos. O anfitrião assente a tudo, consente, autoriza e recomenda. Ouve confissão de crimes.

Mantém-se frio. Profissional.

O visitante diz que está em boa relação com um deputado preso por corrupção. O presidente exulta: “Tem que manter isso aí, viu?” Mais tarde se saberá que o presidente mandava dar alpiste para o passarinho se manter tranquilo na gaiola. O passarinho tem nome de gente: Eduardo. Uma cunha na vida do cacique de plantão. A conversa tem um tom mafioso. O empresário conta que comprou dois juízes e um procurador da República. O presidente pergunta: “Tá segurando os dois?” Diante da confirmação, vibra: “Ótimo, ótimo”. O homem chegou ao poder depois de uma conspiração nebulosa chamada de golpe pelos perdedores e de impeachment pelos ganhadores. Teria agido em nome da moralização do país e do combate a corrupção. Teve apoio da mídia e do mercado por prometer uma ponte para os sonhos do PIB: reformas que ferram a plebe e aumentam os ganhos desmesurados dos camarotes arrancando aplausos, por vezes, até daqueles que pagarão o pato amarelo.

A conversa termina com êxito. O lugar e o horário são considerados perfeitos para tais conchavos republicanos. A pedido do amigo, o chefe da gangue nacional, com som estilo pomposo, indica um interlocutor para os negócios escusos, um tal Rodrigo, que despacha nas horas vagas como deputado federal. Dias depois, em operação controlada da Polícia Federal, o indicado se encontra com o empresário. Depois, recebe do operador do dito cujo uma mala de dinheiro. Quem leu Dashiell Hammmet, George Simenon ou Raymond Chandler sabe como encadear esses fatos e chama isso de prova do crime. Acossado, o empresário decidira fazer delação premiada. Entrega todo mundo. Diz que comprou quase dois mil políticos. Sai livre. Vai morar em Manhattan com sua esposa jornalista.

Como termina a história?

Muitos finais são possíveis. A obra é aberta: o presidente renuncia, é derrubado, sofre impeachment, convence o mercado de que só com ele as reformas serão concluídas, foge com sua jovem esposa para o Líbano, arrepende-se dos seus crimes e pede desculpas ao povo. Ou jura que não sabia de nada. Em substituição o Congresso Nacional elege seu ministro da Fazenda, até 2016 braço direito do empresário delator, mas adorado pelo PIB e visto como salvador da pátria banqueira. O autor propõe perguntas simples ao leitor. Que título dar a essa ficção: “O homem que comprou a República”, “Delação premiada”, “O golpe do século”, “O corrupto que amava mesóclises” ou “Um gângster no Jaburu”?

O livro, de resto, começa com esta frase aparentemente ingênua e destinada a muitas teses ao longo dos anos: “Há um gângster no Jaburu. Quem será?. Ganha uma mala com 500 mil sem chip que acertar”

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Hoje, 18h, no auditório do prédio 9 da PUCRS, falo no Fé & Cultura sobre “Mídia e comportamento ou comportamentos da mídia”. Aberto.

 

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