Um velho liberal

Um velho liberal

Delfim Neto ataca o neoliberalismo selvagem

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      Confúcio antecipou-se a Sócrates.

Escreveu: “Saber que nada sabemos. Eis o verdadeiro saber”. Eu nada sei. Por isso tento aprender com quem sabe um pouco menos do que eu: Paul Krugman, Jared Diamond e, pasme o leitor, Delfim Neto. Um dos melhores textos que li ultimamente tem a assinatura desse velho pilar da ditadura de 1964.

Contra os novos sofistas, Delfim cravou: “Há uma enorme confusão produzida pelos economistas neoliberais (uma contrafacção do liberalismo civilizador) que não reconhecem a existência de dois problemas distintos no processo distributivo: 1º.) a desigualdade de renda entre os homens, que, quando exagerada, cria problemas para a coesão social, e 2º.) a devastadora desigualdade de oportunidades, da qual precisam tomar consciência se quisermos paz”. Precisa mais?

      Neoliberais existem e são diferentes dos liberais. Desigualdade pode não ser mera e natural diferença, mas um abismo que mata. A segunda rajada do velho liberal contra os jovens enganadores é ainda mais letal: “O mal-estar que toma conta de toda a civilização não deriva apenas dos males do capitalismo. Ele é mais profundo. É um ‘malaise’ nascido da tomada de consciência que a virtude social neoliberal vendida como ‘meritocracia’ é uma fraude. A condição necessária para sua existência – a igualdade de oportunidades – não existe”. Nada mais óbvio. Terá a velhice tornado Delfim comunista?

      Será que Delfim nada entende de economia? Enganou todo mundo nos últimos 60 anos? Repita comigo, leitor, e com Delfim: “A virtude social neoliberal vendida como ‘meritocracia’ é uma fraude”. Como criar oportunidades reais? Delfim Neto dá uma dica: “Em que consiste a igualdade de oportunidades e quem pode produzi-la? Só uma sociedade reunida em torno de um Estado de direito Democrático forte e consensualmente construído para praticar políticas públicas que darão a todo cidadão, independentemente de sexo, classe, religião, etnia, cor etc., duas pernas e a mesma capacidade cognitiva para a partida na vida adulta”.

Delfim é contra cotas? Talvez. Eu sou a favor.

Delfim, eis o que importa, defende políticas públicas que gerem reais oportunidades para todos: “A ‘justiça social’ é a igualdade na saída para a vida. Todos com os mesmos instrumentos! A chegada, essa sim, dependerá de cada um, de sua sorte, diligência e capacidade inovadora, inscritas no seu DNA”. Delfim mudou? Aprendeu no caminho? O título desse artigo de Delfim Neto, publicado na Folha de S. Paulo, é “o problema distributivo”. Mensagem: sem distribuição e redistribuição nenhum neoliberal convencido das virtudes do egoísmo soberano dormirá tranquilo. O efeito Chile está aí para despertar aqueles que têm sono mais pesado, os que continuam a citar o PIB per capita chileno para provar que está tudo bem no paraíso estremecido.

Para quem reclamar das ideias de Delfim Neto? Aprendo também com o economista André Lara Resende, um dos país do Plano Real. Segundo ele, “um governo que emite sua própria moeda não tem restrição orçamentária, financeira”.

Ou seja, “ a ideia que o governo não pode gastar, ainda que os gastos sejam justificáveis, é um mito”.

 

 

 

 


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