Uruguai, pátria livre da maconha

Uruguai, pátria livre da maconha

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Proibir o cultivo e comercialização de maconha é burrice.

Uma burrice que só tem uma justificativa: moralismo.

Maconha faz mal? Pode fazer. Álcool também.

Maconha é porta de entrada para outros drogas? Pode ser. Álcool também.

Começou a venda de maconha para cadastrados no Uruguai. São 16 farmácias.

As outras mil não quiseram queimar o filme. Vão ficar de olho na procura.

Formou fila de interessados no primeiro dia.

Quando eu era criança, em Santana do Livramento, dizia-se que o Uruguai era a Suíça da América Latina. Um baita elogio. A gente fica se perguntando se a Suíça era o Uruguai da Europa. A Banda Oriental, onde comíamos “panchos calientes” com uma salsicha enorme riscada com um filete de mostarda picante e tomávamos “helados”, era a pátria da democracia. A ditadura acabou com a festa.

A vida, porém, não cabe em fardamentos.

O melhor presidente uruguaio veio a ser um ex-tupamaro, José Mujica.

Agora, passados tantos anos, o pequeno Uruguai volta a ser vanguarda. Em casos como esse de comportamento eu sou defensor do Estado mínimo: não cabe ao Estado dizer o que um adulto pode ou não consumir. Além disso, o combate ao tráfico de drogas é uma forma de enxugar gelo. O mundo avançado já se deu conta disso e adota nova postura. As estratégias praticadas por décadas faliram. Produziram sangue. Há oferta porque há demanda. Vai botar todo mundo na cadeia?

Seriam milhões de presidiários. A sociedade pratica suas hipocrisias sem constrangimento. Maconha não pode. Álcool, sim. O que faz mais mal? O que mata mais em acidentes de trânsito? Tem político que toma o seu vinho diário e faz campanha contra a maconha. Eu não bebo nem fumo. Fujo de tudo o que pode provocar dependência. Nem café eu tomo. O meu vício é o chá de cidreira. É a minha erva. Erva da paz. Mas não entendo essa guerra perdida que gera violência, corrupção e superlota cadeias. A liberação vai aumentar o consumo e provocar mais problemas como o aumento de acidentes de trânsito? Não é certo. Por que não se proíbe o consumo de álcool, que destrói milhões de pessoas? Porque não funciona. Ficamos assim: o que está liberado continua. E o que está proibido?

O simplismo sempre escolhe a saída da repressão.

O proibido, porém, atrai mais do que o liberado. Na prática, qualquer um pode comprar a sua erva a hora que quiser. O mercado atende seus clientes dia e noite. O dinheiro do combate ao tráfico deve ser investido em educação e saúde. Não digo nada de novo. Especialistas falam disso o tempo todo. É engraçado ver liberais, defensores do mínimo de intervenção estatal na economia, fazendo o Estado cumprir o papel de capitão do mato contra consumidores de drogas. Tem cara que fala assim: “Um bom vinho francês não pode fazer mal. Nem um bom uísque”. Experimente tomar três garrafas por dia. Conheço um médico com uma resposta na ponta da língua para quem lhe pergunta se, de fato, faz bem para a saúde um cálice de vinho por dia:

– O suco de uva faz. Sem o álcool.

Não faço apologia do consumo de maconha.

Faço a apologia da liberdade e da coerência. Se álcool pode, maconha tem de poder também. Os fronteiristas terão de se acostumar com novos recados ou avisos:

– Vou ali do outro lado com o Juan comprar “um” na farmácia. Já volto.

Serei louco, comunista ou irresponsável por pensar assim?

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