Velho Estado Novo

Velho Estado Novo

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Em 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas implantou o seu Estado Novo. A rede social da época era o rádio. O ditador divulgou seu Manifesto à Nação. A mensagem era simples: "Reajustar o organismo político às necessidades econômicas do país”. O grande temor, evidenciado por um documento falso, o Plano Cohen, atribuído ao oficial Olímpio Mourão Filho, era o comunismo. Diante da complexidade da vida e do suposto descalabro nacional “tanto maior há de ser a intervenção do estado no domínio da atividade privada". O Estado queria ser forte também no plano moral.

O gaúcho Flores da Cunha, companheiro de Vargas na revolução de 30, mas resistente à ideia de ditadura, tivera de fugir para o Uruguai. Getúlio dotou-se de uma nova Constituição, feita por um notável, Francisco Campos. A carta de 1934 parecia-lhe irrealista. O plebiscito de aprovação do novo texto nunca foi realizado. O legislativo previsto nunca foi instalado. Só o judiciário e o executivo reinaram. As siglas políticas foram extintas com este argumento: “Considerando que o sistema eleitoral então vigente, inadequado às condições da vida nacional, baseado em artificiosas combinações de caráter jurídico e formal, fomentava a proliferação de partidos, com o fito único e exclusivo de dar às candidaturas e cargos eletivos aparência de legitimidade”. O regime dispensava intermediários.

Vargas queria por ordem na casa recorrendo a métodos mais expeditos ao gosto dos mais ansiosos: “A nova Constituição, colocando a realidade acima dos formalismos jurídicos, guarda fidelidade às nossas tradições e mantém a coesão nacional, com a paz necessária ao desenvolvimento orgânico de todas as energias do país. Os imperativos de ordem e segurança predominam. Garante o trabalho e o capital, a família e o Estado, as atividades produtivas e o funcionamento regular do poder público”.

Um dos problemas de Vargas era com a imprensa. As agências internacionais criticavam o governo. Criou-se o Departamento de Imprensa e Propaganda para reagir. Vargas explicou: “Eu não devia resolver os nossos problemas de acordo com as conveniências da propaganda internacional, e, sim, na base das conveniências do Brasil e da América”. Filinto Müller comandou a repressão. Vargas resumiu legado de 1930: “A Polícia Civil do Distrito Federal, sob o governo revolucionário, redimiu-se perante a opinião pública (...) Em dois sentidos se orientou a ação do Governo Provisório na Polícia Civil: O primeiro se operou pela substituição intransigente dos elementos corruptos por outros de idoneidade comprovada”. O país, segundo o regime, precisava combater a violência e a corrupção.

Civismo e patriotismo tornaram-se os valores sociais fundamentais. Getúlio afirmou: “O Estado Novo não reconhece direitos de indivíduos contra a coletividade. Os indivíduos não têm direitos, têm deveres! Os direitos pertencem à coletividade! O Estado, sobrepondo-se à luta de interesses, garante os direitos da coletividade e faz cumprir os deveres para com ela". Intelectuais foram presos. O escritor Jorge Amado foi em cana duas vezes e teve livros queimados em público. Graciliano Ramos e até Monteiro Lobato foram presos. O jornal O Estado de S. Paulo sofreu intervenção. O DIP tratava Vargas como o mito. Gustavo Capanema, ministro da Educação, simpatizante do fascismo, reclamava da influência comunista na Universidade do Distrito Federal. Na sua Lei Orgânica do Ensino Secundário, de 1942, consolidou a obrigatoriedade da disciplina de Moral e Cívica. O ensino deveria ter como preocupação maior a formação enciclopédica, o conteúdo.

A grande inquietação era de ordem moral. Inimigos da família eram denunciados e deveriam ser aniquilados: “Para combatê-los, é indispensável a união dos brasileiros de todas as camadas sociais e de todos os matizes políticos, antepondo uma muralha intransponível na onda dissolvente que pretende destruir os nossos lares e aniquilar, como patrimônio material e espiritual dos nossos maiores, o próprio futuro dos nossos filhos”.

Mônica Velloso dá o caminho das pedras: “O mito Vargas constrói-se à base de um múltiplo jogo de imagens que o mostram ora como homem comum, identificado com o povo, ora como político eficiente, realizador de inúmeras reformas na ordem social, ora como verdadeiro líder, investido de dotes especiais. Como homem é ‘cordato’, ‘ponderado’, ‘sensível’, ‘pacificador’ (...) como político é o ‘pai dos pobres’, o ‘reformador’, por excelência no campo do direito protegendo a família, ‘doando’ a legislação trabalhista (...). Como líder, é ‘o estadista que prevê o futuro’, o ‘homem providencial’ que exerce efeito terapêutico sobre as massas. O chefe Vargas ainda é visto como exemplo a ser seguido pela nova geração”.

O Estado Novo tornou-se velho em 1945. Tancredo Neves defendeu Getúlio: "Ele se esforçou para se projetar na história como um ditador singular, porque foi um ditador progressista, um ditador humanitário”.

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