Venezuela, uma democracia em crise

Venezuela, uma democracia em crise

publicidade

No Haiti, falta o que comer. A maioria da população está desabastecida e foge do país. Mas o Haiti não está na pauta da mídia internacional. Se tentasse algum tipo de experiência socialista pré-colombiana, viraria tema da CNN e da Fox, a rede de televisão americana da extrema-direita. Por enquanto, a miséria do Haiti e sua população sem voz não interessam a quase ninguém. Não há lacerdinha gritando pela preservação da democracia haitiana.

Na Venezuela, a situação é outra. Maduro tem mostrado incompetência e imaturidade. Mas foi eleito. E não cancelou eleições. Poderá ser vencido na próxima. A Venezuela é uma democracia em crise, não uma ditadura. Em ditadura não tem governador de oposição, como Capriles, discursando, comandando manifestações e preparando a derrubada do governo. Em ditadura não tem jornal de oposição permanente como Tal Cual, El Universal e El Nacional. Em democracia plena, porém, governo não manda embora rede de televisão internacional nem prende opositor, mesmo quando a rede de televisão faz tudo para derrubar o governo e o líder de oposição incita a violência.

Em ditadura não tem general armado desafiando o governo. Em democracia plena, no entanto, não tem prisão arbitrária. Maduro está acossado. Há na sua situação um pouco do que aconteceu no Chile de Allende, com a direita forçando a deposição e os Estados Unidos ajudando por baixo do pano. Mas a situação é diferente. Não se pretende colocar uma ditadura militar no lugar. Somente um governo neoliberal que freie as políticas sociais e devolva o lucro do petróleo aos ricos, liberando a fonte para consumo americano sem entraves nem conflitos.

Há um pouco da situação de Jango no que acontece com Maduro. Jango também era visto como incompetente, com tentações autoritárias e comunistas. Os Estados Unidos organizaram as Marchas da Família com Deus pela Liberdade para legitimar a sua derrubada. A mídia também apregoou que vivíamos o caos e a indisciplina militar.

Épocas diferentes, situações similares. Boa parte dos que odeiam Maduro no Brasil não o fazem por ele ser incompetente, mas por representar o socialismo chavista. É uma oposição ideológica pura e simples. É preciso provar que cada tentativa desse tipo não dá certo. O autoritarismo das ditaduras de direita, como a de Pinochet, passa como uma nota de rodapé na história, um desvio, sem gerar espanto nos conservadores. Só aplausos.

A argumentação contra Maduro no Brasil é feita, em geral, de exageros, simplismos, asneiras, estratégias retóricas abusivas, reacionarismo macartista, má-fé, ignorância e desejo explícito de um golpe de Estado.

A Venezuela não pode se tornar uma ditadura, nem de esquerda nem de direita. Precisa evitar que a democracia entre definitivamente em crise. No começo deste século, viveu situação semelhante. O golpe contra Chávez chegou a ser dado. Na época, CNN, Fox, Globo e outros saudaram o fim da ditadura e a chegada da democracia. Os Estados Unidos queriam reconhecer o governo golpista. A farsa foi desmascarada. É mais um capítulo dessa novela.

Um capítulo que se soma aos erros do governo e à sua incapacidade de gerir o conflito.

O fim, porém,  ainda não está escrito.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895