Um novo jeito de promover literatura

Onde estão as bancas e os expositores? A Praça da Alfândega está vazia de um jeito incomum. Nenhum leitor passa carregado de livros. Não há sessões de autógrafos presenciais. E, muito menos, a tradicional agitação que o período anual costumava trazer para o Centro Histórico. Um ano atípico em diversos sentidos também alterou um dos mais tradicionais eventos da capital gaúcha. Depois de 65 edições, a de 2020 é a primeira na história em que a Feira do Livro de Porto Alegre está ocorrendo em formato virtual. 

A escritora porto-alegrense Ana Margareth Gonçalves contou que sua mãe sempre incentivou o hábito da leitura em sua casa. Na infância, Ana morava na Rua dos Andradas e participava de todas as edições. Graças a essa antiga relação, a escritora coleciona boas lembranças em relação ao evento. Ela disse que a feira mudou bastante ao longo das últimas décadas. “Antes não eram tantas bancas assim, a feira já foi ao ar livre e só depois começou a ser coberta”, afirmou.

Para Ana, utilizar a tecnologia para realizar o evento foi uma boa solução. Ela contou que está acompanhando a programação, tanto como escritora quanto como leitora. Outro ponto destacado por ela foram as diversificadas atrações deste ano, com opções para todos os públicos: crianças, jovens e adultos. Apesar disso, ela confidenciou estar com saudades do presencial. “Uma das características da feira é o encontro. Cruzar com os autores frequentando as bancas e confabular sobre livros. Manusear as obras, escolher e ir embora com a sacola pesada”, relembrou.

O desafio de transpor o evento para uma plataforma digital foi grande, conforme Lu Thomé, jornalista e curadora da Programação Geral da 66ª Feira do Livro de Porto Alegre. Ela explicou que a mudança mais significativa foi fazer com que as atividades não tivessem um viés quantitativo, mas qualitativo. “Colocamos todo o foco em cima do debate a partir do universo do livro para temas essenciais”, declarou. A alteração se deve, principalmente, por conta da pandemia e as reflexões que esse momento traz às pessoas. 

A organizadora afirmou que a modalidade virtual “facilitou a participação de autores distantes que, em uma edição presencial, talvez não pudessem participar. Como foi o caso da escritora chilena Isabel Allende”. Além disso, ressaltou que o debate ganhou muito, pois as pessoas estão interagindo e mandando perguntas durante as transmissões. “Uma das nossas grandes alegrias é que pessoas de vários estados estão participando das lives e temos tido audiências que ultrapassarem a capacidades das salas (das edições presenciais)”, disse. Pensando nas edições futuras, Lu explicou que já está sendo debatida a possibilidade de a Feira do Livro adotar um modelo híbrido. Dessa forma, as facilidades do virtual seriam unidas a forma tradicional de promover o evento. 

Uma das beneficiadas pela nova modalidade foi a jornalista e audiodescritora Luana Nascimento. Ela mora na cidade de Ponta Grossa, no Paraná e, neste ano, por meio das redes sociais, descobriu a Feira do Livro de Porto Alegre. Luana vem participando dos eventos virtuais. Ela declarou que a versão remota tem seus benefícios e barreiras. “O gostoso de feiras e festivais é o contato, a troca e a conversa. No digital isso se perde um pouco. Porém, permite que descubramos mundos que não teríamos acessos”, explicou. 

A jornalista disse que mesmo estando na cidade do evento, é complicado participar de toda a programação. Por isso, a possibilidade de assistir as transmissões de onde estiver é um ponto positivo. Ela também elogiou a diversidade de temáticas da programação do evento. “Vemos falas e vivências de diferentes pessoas e lugares. Irei acompanhar outras edições, com certeza. Espero que nas próximas eu possa estar presente fisicamente. Além de poder acompanhar no formato digital que creio ser uma novidade que veio para ficar nos eventos culturais de todo o país”, concluiu. 

Henrique Abrahão / Unisinos
Kainan Mews / UniRitter 
Kassiane Michel / Universidade Feevale