A violência vem de berço e das redes

A violência vem de berço e das redes

Oscar Bessi

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Neste país que idolatra a estupidez e glamouriza de forma ridícula (mas bem lucrativa) sua própria ignorância, a professora Elisabeth Tenreiro foi uma heroína. Mais uma, na verdade, entre milhares de professoras e professores brasileiros que enfrentam, todos os dias, armados apenas de conhecimentos e ideais, esse tortuoso caminho que nos leva ao sonho de viver num país melhor e menos violento. O caminho da Educação. Com “E” maiúsculo. O único caminho. Aos 71 anos, ela não quis se aposentar por amor ao ofício de ensinar. De conduzir. De abrir os olhos da meninada para que pudessem ver que há um caminho possível e decente que eles merecem. E sim, há muita alternativa fora da cegueira bitolada do modismo, da banalização, do consumismo e da superficialidade. Há o pensamento crítico e independente. Há o conhecimento científico. Mas a alegre e inquieta luta da professora Elisabeth por interrompida pela faca de um menino de apenas 13 anos. Uma criança que talvez seja mesmo vítima de bullying, como afirma para justificar o ato cruel, que anunciou, naquele mesmo dia, em suas redes sociais antes de cometê-lo, ou apenas mais uma mente arrastada pela maldade epidêmica que nos cerca.

Um relatório recente aponta dados sobre violência escolar no Brasil que, sinceramente, coloco em dúvida. E são dados que foram coletados só após o ano 2000, antes nem se dava bola para o assunto. Mas tenho certeza de que há muito mais professores sendo vítimas de ameaças, falta de respeito e agressões físicas ou verbais nas escolas brasileiras do que aponta o tal relatório. Outro ponto que discordo é o parecer que joga no colo do professor a responsabilidade por “detectar” comportamentos estranhos, propensos à violência, em sala de aula. Mais esta? Já não chega remar contra a maré para tentar fazer o básico da sua profissão, que é repassar o conhecimento, e isto em escolas sucateadas, enfrentando a todo momento a resistência de pais, alunos e governos? Esses que parecem nem querer que a escola exista, afora para quebrar um galho como babá de suas crianças a fim de que não fiquem pelas ruas?

Uma das cenas mais chocantes e lamentáveis dos últimos tempos foi vista no estádio Beira-rio, numa das semifinais do Gauchão. Um torcedor não contém o seu descontrole e corre na direção de um jogador do Caxias para agredi-lo. Só por isto, o fato já era abominável, tão abominável quanto as agressões dos jogadores colorados que não aceitavam ver o adversário comemorar sua vitória e partiram para a violência física. Mas esse pai estava com uma criança no colo. Uma menininha de apenas 3 anos de idade. Por sorte, o equilíbrio do jogador caxiense, ao ver a criança, impediu a continuidade das agressões. Mas era o pai que devia pensar no que estava fazendo. No exemplo que estava dando. No risco que estava proporcionando para aquela inocente. É esta educação que vem de berço: a educação da violência gratuita e justificável por qualquer emoção, a educação da ausência de respeito ao outro, a educação da brutalidade. Essa “deseducação” nasce nos berços das nossas crianças e é fomentada nas redes sociais a todo o instante. E só o professor terá que lutar contra isto? Até quando? Quantos outros ainda morrerão ao tentar reverter a marcha insana da boiada?


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