As indústrias do crime

As indústrias do crime

Oscar Bessi

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Já conversamos sobre isto, aqui na coluna. A variedade de negócios ilícitos e violentos que hoje são abarcados por grupos criminosos para se fortalecerem. E sejam sempre, e cada vez mais, grupos meramente criminosos. Por essência e gênese. Opção e mercado. Ponto final. A figura do traficante de drogas que só vendia drogas e, pelo monopólio de negociá-las, mandava na boca, já era. Nada de pequenos negócios exclusivos. Roubos, assassinatos, facilitadores, atravessadores de cargas, comerciantes inescrupulosos. Jogo e prostituição. A renda vem de várias fontes. O mercado de vítimas é gigante e os caras estão organizados. A operação realizada pela Polícia Civil e Brigada Militar na última quinta-feira mostra bem isso. Roubos de cargas, principalmente de cigarros, eram crimes a capitalizar outros crimes, entre eles o tráfico de drogas, praticados por uma facção porto-alegrense. O dinheiro dos assaltos proporcionava, entre outras coisas, a compra de mais armas potentes. Mais fuzis nas nossas ruas. Entre nós. Entre nossas crianças. Armas prontas para trucidar suas vítimas, como numa guerra.

Há um lado bom, aí. Meu lado otimista é tímido e minoritário, mas resiste. Se os traficantes de drogas não conseguem mais se sustentar apenas com esse comércio, então é porque há luz no fim do túnel. Talvez estejam começando e ter prejuízo. As polícias vencem batalhas todos os dias contra o tráfico, basta espiar as notícias aqui no Correio do Povo. Dono de revenda na capital preso com 18 quilos de maconha. Grande quantidade de cocaína apreendida na Lomba do Pinheiro, Intercap, Campo Bom, Viamão, Caxias e Montenegro. Eles perdem todos os dias, em todo o Estado, para as forças de segurança. Já pensou se os gestores públicos investissem em educação e saúde, de verdade? Se valorizassem os policiais? A vitória estava garantida. Mas há também o inequívoco (e outro) lado ruim disso tudo: a violência tende a se alastrar, porque eles vão precisar sempre de mais dinheiro. Terão que aumentar os roubos e os outros negócios do crime. Não estão comprando fuzis para pendurar na parede do quarto como um quadro, caros doutos. É para roubar mais. Lucrar mais. E matar mais. Haja polícia para segurar tudo isso.

E o outro lado ruim, que insiste em dar bofetadas de realidade em nossos pobres sonhos esperançosos, é a nossa velha e bem refestelada hipocrisia. Sustentamos o crime enquanto reclamamos do medo. Compramos cigarros roubados, carros clonados, autopeça sem procedência e por aí vai. Achamos que drogas não fazem tão mal assim. Aceitamos passivamente a absolvição de assassinos frios, abusadores de crianças, estupradores reincidentes e aceitamos que loucos violentos sejam liberados para matar de novo, em troca de um celular ou de uma joia, vigiados apenas por uma tornozeleira que não impede nada. Fingimos que cremos em ressocialização, nem reclamamos de quem pergunta ao "pobre" bandido se foi bem tratado pela polícia que o prendeu, num deboche à vítima que ele recém torturou num assalto. Incentivamos as indústrias do crime a crescerem, de várias formas, explícitas ou não. Bancamos o jogo e saímos sempre derrotados. E reclamamos é da Polícia. Enquanto nos oferecemos, feito gado de abate, às diversas indústrias do crime.


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