Pietro Fittipaldi e o retorno nos 40 anos do Brasil na Fórmula Indy: "Nunca desisti"

Pietro Fittipaldi e o retorno nos 40 anos do Brasil na Fórmula Indy: "Nunca desisti"

Piloto brasileiro concretiza jornada interrompida por grave acidente e vai correr na equipe Rahal, rival do avô

Bernardo Bercht

publicidade

Os 40 anos do Brasil na Fórmula Indy terão um representante no grid durante toda a temporada. Em uma categoria que consagrou nomes como Gil de Ferran e Hélio Castroneves, simbolicamente o país “volta às origens”. Em 1984, Emerson Fittipaldi saiu de um teste na Fórmula 1 para estrear no GP de Long Beach. Agora, seu neto Pietro Fittipaldi deixa a posição de piloto de testes da Haas F1 para correr em solo norte-americano. “Eu nunca desisti, todos os anos eu ligava para os times, atualizava meus resultados. Tive que agarrar com as duas mãos a chance com a Rahal.”

Aos 27 anos, Pietro não é estreante e muito menos inexperiente. Carimbou o título de 2017 da Fórmula V8 3.5, antiga categoria de acesso à Fórmula 1, disputou oito provas e momentos esporádicos da Indy, andou no Mundial de Endurance, na Fórmula Nippon do japão e até na DTM alemã. Emplacou uma longa carreira de terceiro piloto da Haas F1 e chegou a estrear na categoria em dois GPs de 2020.

O sobrenome famoso não garantiu enormes patrocínios e acabou gerando uma carreira “itinerante”. Onde “dava para correr”. No meio de tudo isso, um evento dramático em 2018 marcou a carreira de Pietro. Uma falha eletrônica do seu protótipo no Mundial de Endurance arremessou o carro no muro da curva Eau-Rouge, em Spa-Francorchamps, fraturando as duas pernas do piloto.

Foi uma extensa recuperação e que ele optou por fazer dentro de Indianápolis. Pietro viveu em um motorhome dentro da pista para fazer os tratamentos e fisioterapias no famoso Indianapolis Trauma Therapy Center, referência mundial por tratar dos acidentados nas 500 Milhas. Ali na sua “casa” das corridas, Pietro falou com o Correio do Povo pela primeira vez. “Tem dias bem difíceis na fisioterapia, estou me readaptando a tudo. Mas quero voltar e ainda fazer uma temporada parcial na Indy”, frisou na época.

E ele fez quatro corridas no fim do ano, com um nono lugar como melhor resultado. Na última prova, em nova entrevista, comentou o sacrifício de andar ainda com a perna machucada, usando uma órtese especial. “Não estou 100%, fiz um raio-X e ainda tenho fratura na perna esquerda. Mas todo fim de semana vou podendo frear mais forte”, destacou no fim de 2018.

O acidente impediu contratos de ano inteiro, obrigou adaptações, mas a variedade, pode ser um diferencial do brasileiro. “Me sinto muito preparado para esse desafio da Indy. É uma grande oportunidade estrear por um time como a Rahal”, exalta. “Eu estou com ritmo de corrida pelos campeonatos de Endurance. Tinha uma proposta para correr no Hypercars (que disputa a vitória nas 24 Horas de Le Mans), mas estou há anos tentando uma chance para correr a temporada completa da Indy. Esse ano o Rahal confiou e vamos fazer um grande trabalho em 2024”, avalia.

Sobre os desafios, a quilometragem em carros competitivos ele admite que não será suficiente. “Nos últimos dois anos fiz campeonatos completos na European Le Mans e no WEC. Mas a Indy é mais exigente”, avalia.

“Para avançar nas sessões às vezes o cara precisa de meio décimo. Então precisa sintonizar bem com o carro de imediato e maximizar tudo”, explica. Pietro lembra do principal título da carreira, na Fórmula V8, e que conquistou em cima, exatamente, do atual bicampeão da Indy, o espanhol Alex Palou. “A gente competiu muito um contra o outro. Me empolga ver um cara que corri junto ter muito sucesso", conta Pietro. “Chegamos a fazer uma pole-position em Austin com o mesmo tempo de volta, no milésimo.”

O veterano estreante tem a receita para um ano de sucesso, que encaminhe mais temporadas nos EUA. “Eu gosto de me dedicar muito e me esforçar muito. Já estou vendo para morar em Indianápolis e poder estar na oficina todo dia.”

Fittipaldi x Rahal: rivalidade e parceria

O retorno dos Fittipaldi à Indycar tem mais um tempero, além dos 40 anos do Brasil na categoria. Pietro vai correr no time de um grande rival do avô e um dos maiores da categoria em todos os tempos: o tricampeão da Fórmula Indy Bobby Rahal. Há mais uma simetria entre chefe e piloto: Rahal também fez dois GPs de Fórmula 1 na carreira, pela equipe Wolf em 1978.

“É um privilégio fazer parte de uma família de corridas, que entende como funciona o mundo do automobilismo”, destaca Pietro, que viu Emerson, Wilson e Christian correrem na F1 e Indy antes dele. E agora tem o irmão Enzo disputando a Fórmula 2. “E a Rahal também tem essa origem nas pistas. Vi ganhar corridas com meu tio Max Papis, e duelar contra meu avô e meu tio, Christian. Eu lembro muito daquelas provas”, exalta o piloto brasileiro.

Entre 1984 e 1996, Emerson enfrentou o auge de Bobby Rahal nos EUA. Em 1986 e 1987 viriam os primeiros títulos do norte-americano. Com direito às 500 Milhas de Indianápolis de 86. O brasileiro respondeu com tudo em 1989, vencendo as 500 Milhas e o campeonato. “As corridas que fiz contra o Emerson foram muito especiais. Por anos era muito grande a influência brasileira na Indy”, destaca o ex-piloto e agora chefe de Pietro.

Rahal ainda faturou o campeonato de 1992, já como dono do seu próprio time; enquanto Emerson responde com as 500 Milhas de 1993. Uma batalha clássica entre dois pilotos históricos. Duas lendas.

Depois viria uma legião de brasileiros vencedores como o bicampeão Gil de Ferran, o campeão Tony Kanaan, o tetracampeão de Indianápolis Hélio Castroneves e os vencedores de provas como André Ribeiro, Maurício Gugelmin e Roberto Moreno. “Raul Boesel correu para o meu time. Era uma lista enorme nos desafiando e ganhando corridas. O Pietro vai ser o próximo desse legado do país, espero que tenha muito sucesso com a gente”, celebra Rahal.

Sobre Pietro, ele espera que a experiência diversa do brasileiro possa ajudar no desenvolvimento do time. "Ele teve muito sucesso nas categorias de acesso. Se classificou como a melhor estreante em 2021 para a Indy 500, em 13°. Teve algumas boas corridas nas poucas que fez", avalia. “Ele tem uma ética de trabalho e um foco muito importante. Não há dúvidas do que ele quer fazer. Então estou empolgado por isso.”


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895