Memórias, sentimentos e sentidos em xilogravuras

Memórias, sentimentos e sentidos em xilogravuras

Santídio Pereira, de 26 anos, da nova geração de artistas brasileiros, expõe na Fundação Iberê a partir deste sábado, às 14h

Santídio Pereira e suas xilogravuras em seu ateliê

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 Fundação Iberê abre o ano de exposições com a primeira individual em um museu de Santídio Pereira, 26 anos, um dos nomes mais importantes da arte contemporânea no Brasil. Esta é, também, a primeira vez que o artista vê este conjunto de obras, a maioria de colecionadores, reunido em uma mostra. “Santídio Pereira – Incisões, recortes e encaixes” apresenta 22 obras, que vão de 120 X 90 cm a 223 x 180 cm, que resgatam a infância do artista em Curral Comprido, povoado próximo a cidade de Isaías Coelho, no Estado do Piauí. São memórias afetivas em xilogravura e offset impressas em papeis kashiki, hahnemühle, sekishu, wenzhou, fabriano disegno e de arroz chinês 100% de algodão. 

A mostra que abre hoje, 14h, no segundo andar da Fundação Iberê (Padre Cacique, 2000) segue até o dia 1<SC120,176> de maio de 2022. Ingressos: bileto.sympla.com.br/event/66447. Estão com 50% de desconto até o dia 6 de março. 
Santídio mudou-se para São Paulo, em 2002, com seis anos de idade. Aos oito, ingressou nas “oficinas de fazeres” do Ateliescola no Instituto Acaia, ONG privada, sem fins lucrativos, que atende crianças e adolescentes residentes próximo à Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), local onde também trabalhou. Aos 14, começou a gravar sob orientação de Fabrício Lopez e Flávio Castellan e, aos 18, se despediu do tempo permitido na ONG, determinado a ser artista. 

A xilogravura atendeu aos primeiros interesses do artista, que desenvolveu procedimentos próprios de trabalho, como a que ele denomina “incisão, recorte e encaixe”, ou seja, a composição por meio da combinação de várias matrizes recortadas, como peças de um quebra-cabeça. Além de proporcionar um jogo de cores através do acúmulo e justaposição de tinta, essa técnica permite subverter a função de multiplicidade, tão característica da gravura. Com o tempo, a materialidade das tintas trabalhadas sobre o papel passou a protagonizar a investigação de Santídio e, até hoje, norteia sua produção. A experimentação no estudo das cores tornou-se vetor importante para expressar memórias, sentimentos e sentidos, que são inerentes também à cultura e aos fazeres populares dos lugares por onde esteve. Não à toa, o artista sentiu a necessidade de aumentar a superfície de apreciação das cores, aumentando a escala de suas obras.

São duas as séries de xilogravuras mais representativas de Santídio: “Pássaros” (2018) e “Bromélias” (2019). A memória afetiva levou o artista a investir numa pesquisa iconográfica sobre os pássaros da Caatinga do Piauí. Além de procurar entender os saberes populares e a relação das pessoas com esses animais, Santídio foi estudar biologia e mitologia. Desde o começo da carreira do artista, a investigação com gravura vem abrindo portas para outras técnicas e suportes, sempre atraindo pela materialidade e sua representatividade nas artes visuais. A série de pinturas “Morros” (2021) surgiu com o sentimento de liberdade ao se deparar com visualidade da paisagem natural de Santo Antônio do Pinhal, Serra da Bocaina e da Cantareira, todas em São Paulo, e como ela resgata reminiscências de cores, imagens e sensações. Utilizando tinta offset, a mesma da produção das xilogravuras, Santídio também parte do princípio de “incisão, recorte e encaixe” para criação das composições em pintura sobre papel Hahnemuhle, traduzindo as sensações através das gradações de cores e justaposições. Ultimamente, Santídio vem pesquisando e desenvolvendo trabalhos em Aquarela, tinta Offset, Xilogravura e Monotipia.

“Muitas vezes, as ‘xilos’ em preto e branco de Santídio ainda guardam a lembrança do aprendizado e revelam uma aspereza de que ele sabe tirar partido. Em vez de tentar imitar pequenos detalhes de uma folhagem, por exemplo, ele se aproveita das irregularidades da madeira rachada – lembro leitor que hoje em dia muitos xilogravadores, por motivos práticos, lançam mão de madeiras compensadas para realizar suas estampas”, escreveu Rodrigo Naves para a exposição “Cores em Preto e Branco”, na Galeria Estação (SP), em 2016. 


Correio do Povo
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