Oscar: extensão de Hollywood

Oscar: extensão de Hollywood

Eron Duarte Fagundes *

Jessica Chastain é uma das candidatas ao prêmio de Melhor Atriz do Oscar, cuja cerimôna é neste domingo

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O Oscar é um cerimônia de premiação de filmes do ano anterior. Acontece nos Estados Unidos, em Los Angeles, desde 1927. Tem alguns aspectos na cerimônia que a fazem uma extensão do cinema feito em Hollywood: a valorização do cinema como indústria. Quem define as premiações são os membros da chamada Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Desde 1953, a cerimônia é exibida pela televisão, meio que em determinada época foi concorrente do cinema na disputa do público.

Como toda premiação, mesmo em Cannes ou Berlim, um prêmio no Oscar é uma jogada política e também comercial. Na apreciação de um filme o valor dum prêmio é nulo.
O Oscar que premiou os filmes de 1979, realizado em abril de 1980, me ocorre como exemplo de funcionamento destas premiações. Premiando O tambor, do alemão Volker Schlöndorff, como o melhor filme estrangeiro, a Academia ajudou as plateias a tentar digerir este filme complexo, que no ano anterior, em Cannes, já dividira a Palma de Ouro com o espetáculo norte-americano “Apocalypse Now”, de Francis Ford Coppola; nestas duas premiações separadas por um ano, o Oscar e Cannes se juntam numa de suas funções, vender um filme.

Na premiação do melhor filme americano de 1979, esta cerimônia do Oscar de 1980 é também característica duma de suas faces como representativa duma época cinematográfica. O melodrama Kramer versus Kramer, de Robert Benton, narrativa incrustada no sentimentalismo vulgar disseminado por muitos filmes à borda de Hollywood entre o fim dos anos 70 e começo dos 80, ganhou o prêmio principal. Apocalypse Now”, o delírio barroco de Coppola em torno da guerra do Vietnã (outro assunto então na moda), embora festejado em Cannes, e apesar de muito mais criativo que o filme de Benton, ficou com os prêmios de consolação, o de fotografia e o de som. Na disputa de melhor filme estava também “O show deve continuar, de Bob Fosse, talvez o maior musical da história do cinema e um complexo jogo de magia metalinguística que pouco interessaria à indústria. E havia ainda "Norma Rae", de Martin Ritt, que trazia os elementos sentimentais do cinema americano habitual na época, mas com uma carga crítica muitas vezes maior que Kramer versus Kramer. Sem falar em O vencedor, de Peter Yates, muito elogiado até hoje, mas que este comentarista nunca chegou a ver, portanto não pode divagar muito. Compreende-se: “Kramer versus Kramer” tem a cara de Hollywood, do Oscar, do cinema médio americano de seu tempo.

O Oscar 2022, revendo filmes de 2021, acontecerá no fim de março próximo. Há filmes que podem ter menos cara de Oscar: “O Beco do Pesadelo”, de Guillermo del Toro; “Licorice Pizza”, de Paul Thomas Anderson; “Ataque dos Cães”, de Jane Campion. E há quem tenha alguma cara: “Duna”, de Denis Villeneuve; “Belfast”, de Kenneth Branagh. E há os que poderiam ter uma cara mais inteira: Amor, Sublime Amor, de Steven Spielberg; “No Ritmo do Coração”, de Siân Heder. E, mais cara ainda: Não olhe para cima, de Adam MacKay. Não sou especialista neste jogo de adivinhações do que vai na cabeça dos acadêmicos de Hollywood; também esta é uma parte do jogo cinematográfico que me interessa muito pouco. Uma coisa é certa: se eu fosse julgador, votaria sem piscar em Jessica Chastain como melhor atriz por sua interpretação em “Os Olhos de Tammy Faye”, de Michael Showalter.

* Crítico de cinema e literário

 


Correio do Povo
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