Chilique acadêmico

Chilique acadêmico

Guilherme Baumhardt

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O encerramento de quase duas dezenas de cursos de pós-graduação de uma universidade privada no Rio Grande do Sul ganhou o noticiário nos últimos dias. A preguiça dominante não demorou para apontar o culpado: claro, ele, sempre ele, Jair Bolsonaro. Contudo, se quisermos fazer um debate realmente produtivo, temos agora uma excelente janela de oportunidade.

A busca de cursos no exterior sempre foi uma realidade. Era normal e bem-vindo, um intercâmbio saudável, estabelecendo uma relação ganha-ganha. Estudantes norte-americanos faziam doutorado em países europeus; chineses buscavam instituições dos Estados Unidos; sul-americanos viajavam para a Ásia. Bastante comum nos cursos de pós-graduação, raro no início da vida acadêmica. Hoje, inúmeros pais e mães brasileiros, com condições financeiras, preferem bancar a faculdade dos filhos fora do Brasil. E por quê? Estamos diante de uma luz de alerta acesa. E a resposta parece simples: a busca por qualidade, para formação de profissionais que entrem no mercado em condições de competir pelas melhores posições. E se buscam fora, é porque não encontram aqui. Tentemos, então, buscar respostas.

Houve um tempo em que eu defendia a estabilidade funcional dos professores de universidades públicas como uma espécie de garantia do “livre pensar”, sem qualquer tipo de interferência econômica. Eu estava errado. O que vimos foi um sistema que se voltou para si, hermeticamente fechado e que se transformou em um cluster ideológico esquerdista. Há exceções, é claro. Mas nas universidades públicas reina a seguinte lógica: ou você é de esquerda, ou está fora. E, se o sistema falhar e você entrar, será excluído das ferramentas que garantem dinheiro e financiamento para pesquisa, por exemplo.

Além disso, nas instituições públicas federais, havia uma espécie de mundo da fantasia, um descolamento da realidade, que ficou evidente quando foi aprovada a lei do teto de gastos, em âmbito federal. Os orçamentos passaram a ser corrigidos com base na inflação oficial do país. A consequência? Após a mudança, virou rotina a gritaria de reitores, já na metade do ano, alegando que não teriam dinheiro para bancar o custeio dos mastodontes que tentam dirigir. Bem-vindos à vida real.

No caso das universidades privadas, também houve bolhas. A pior e mais nefasta foi o desvirtuamento (ainda nas gestões petistas) do financiamento do ensino superior. Em poucas palavras: gente que deveria batalhar por uma bolsa do ProUni conquistou um empréstimo do governo federal, graças ao afrouxamento das regras de concessão do crédito estudantil. Travas existem. Funciona assim na hora de comprarmos uma casa, um carro. Nossa vida financeira passa por uma avaliação. Era assim no caso dos financiamentos do ensino superior, até que as iluminadas cabeças petistas resolveram fazer populismo barato. Virou uma festa. Até o dia em que a inadimplência estourou e o barco começou a fazer água.

Com honrosas exceções, falta ainda uma maior sinergia entre setor privado e as instituições de ensino. E talvez exista uma boa dose de culpa em ambos os lados. No caso do mercado, por exemplo, que não procura as universidades, falta enxergar ali uma oportunidade de investimento, de onde podem sair dividendos em infraestrutura e formação. No caso das faculdades, é preciso se livrar do ranço e da resistência em abrir as portas para quem produz e gera riqueza – mais uma maldição produzida pelo império esquerdista construído nas universidades, especialmente as públicas, mas não apenas elas.

Se você for ouvir um militonto, ele dirá que o atual governo federal desmantelou o ensino superior. Se você analisar friamente o que restou depois de 14 anos de gestões petistas, verá uma máquina que inchou, com o aumento do número de universidades, com concursos que brotavam como inço em terra fértil. E o resultado disso tudo? Muito pouco ou quase nada. Na cabeça da turma que comandou o país, pouco importa o resultado. Não há nenhuma intenção em estabelecer meritocracia e definir metas significa "mercantilizar o ensino". Se a grana do pagador de impostos estiver entrando, basta para a patota que tornou privadas instituições que deveriam ser públicas, mas se renderam às corporações que nelas habitam.


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