La garantía soy yo

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Mercosul não engatinha. Ele sequer nasceu

Guilherme Baumhardt

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A proposta é tão descabida e sem propósito que chego a desconfiar que ela tem como único objetivo criar uma espécie de cortina de fumaça, de tirar o foco de algo realmente importante, para puxar a atenção para uma ideia que é natimorta, para em pé. Sim, Brasil e Argentina voltaram a aventar a criação de uma moeda única para a América Latina. Só pode ser piada. E de mau gosto.

Um bloco econômico que até hoje não conseguiu derrubar os postos de controle na fronteira não está engatinhando. Ele sequer nasceu. Quando você viaja de carro ao Uruguai, aqui ao lado, precisa parar, identificar-se e comunicar o ingresso no país vizinho, com carimbo, papelada e tudo aquilo que a burocracia adora. Ah, e nada de contar com a carteira de habilitação como documento. Para isso, ela não vale nada. Precisa ser identidade ou passaporte.

Vamos além. O controle pré-histórico e em excesso não para por aí. Quem nunca foi parado pela Receita Federal, voltando de Rivera, Chuí ou Jaguarão, para ter o porta-malas revistado? Não, não é uma procura por armas ou a busca por foragidos. É para contar quantas garrafas de vinho ou whisky você resolveu comprar no freeshop e trazer ao Brasil. Para verificar se você não estourou a cota. Sim, nós fazemos concursos públicos, para contratar gente que fica nas fronteiras do país abrindo porta-malas para contar garrafas. Sem exageros.

Sim, há uma série de distorções. Há pressões internas e eu entendo que existam. A indústria nacional alega (com razão) que o produto que vem de fora chega com maior grau de competitividade. Paga menos imposto, as relações de trabalho em outros países são mais livres e não regradas pela velha e arcaica CLT, entre outras questões. Mas no lugar de resolver isso (sim, leva tempo e dá trabalho), a gente adota o caminho inverso. "Ah, mete um fiscal na fronteira e tá resolvido", diz o burocrata de Brasília. Raciocínio torto, trabalho porco.

No mesmo embalo, pergunto: quantos acordos comerciais o Mercosul fechou com outros blocos comerciais? Quanta riqueza foi gerada pela "soma de esforços e interesses comuns" dos países que formam o Mercado Comum do Sul? Muito pouco, quase nada. Por essas e outras é que soa como piada a tentativa de criação de uma moeda única para o continente.

Além disso, levar adiante a ideia é mais ou menos como chamar para ser seu sócio aquele amigo gente boa, mas preguiçoso, que não serve de exemplo quando o assunto é trabalho ou dinheiro. Não me refiro aqui, por exemplo, ao povo argentino (trabalhador) e às áreas de excelência no país vizinho (elas existem), mas sim ao governo atual.
A administração Alberto Fernández, discípulo dos Kirchner, é irresponsável, perdulária e especialista em uma coisa: gerar inflação. É isso que queremos importar? É com gente assim que queremos nos aproximar ainda mais? É mais uma fórmula do fracasso sendo colocada em prática.

Além do mais, há um componente que não será ultrapassado: os dois países são grandes produtores de commodities, produtos com preços internacionais. Soja, minério de ferro e outros. Não haverá como fugir do dólar e do câmbio com a moeda norte-americana. Nem mesmo a China, segunda maior economia do mundo, faz isso.
Ou seja: se é mesmo uma cortina de fumaça, não se surpreenda se amanhã ou depois não surgirem anúncios de obras de empresas brasileiras em solo hermano, ou ainda novos programas como o Mais Médicos, projetos que não passam de atalhos para injetar o nosso dinheiro nos governos da companheirada amiga.


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