O fator Moro

O fator Moro

O que Moro não tem? O traquejo de político

Guilherme Baumhardt

Presos são suspeitos de invadir celular do ministro Sergio Moro

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Está marcado para o dia 10, semana que vem, o ato de filiação do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro ao Podemos, partido do qual fazem parte os senadores Lasier Martins e Álvaro Dias. Faltando pouco menos de um ano para a eleição, Moro parece ser o único nome, neste momento, com forças para mexer no tabuleiro. A tarefa, porém, não será fácil.

Antes de avaliar o potencial de uma candidatura de Moro ao Palácio do Planalto, é interessante lembrar os nomes que ficaram pelo caminho. E aqui está uma grande diferença entre o período que antecede o pleito de 2022 dos anteriores. É natural que entre uma eleição e outra surjam especulações e vários balões de ensaio sejam lançados. Mas “nunca antes na história deste país” (parafraseando um ex-condenado) tantos testes foram feitos.

O apresentador de televisão Luciano Huck talvez tenha percebido que entrar na disputa pela Presidência não passava de “loucura, loucura, loucura”. O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta tentou surfar na onda do coronavírus, mas bandeiras defendidas por ele na época se mostraram ineficazes, enquanto outras são altamente questionáveis (os lockdowns, principalmente). O ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia caminha a passos largos para o ostracismo. De todo poderoso da República (com veículos de imprensa tentando dar a ele um verniz de primeiro-ministro) se transformou em um secretário de Estado apagado na gestão de João Doria Jr, em São Paulo. Se entrar na disputa, tenho sérias dúvidas se conseguirá renovar a cadeira que hoje detém no Congresso, representando o Rio de Janeiro.

E Moro? O ex-juiz ainda carrega um legado interessante. É visto como um sujeito sério e que teve a coragem de colocar gente graúda na cadeia, algo comum em países desenvolvidos, mas raro em republiquetas como o Brasil. Sim, é verdade que os julgamentos foram anulados e, com isso, Lula virou um ex-condenado e pode agora concorrer novamente a cargos públicos. Mas quem protagonizou a reviravolta (para não dizer palhaçada)? O Supremo Tribunal Federal, instituição que hoje goza de zero prestígio junto aos brasileiros. Ou seja, a Moro basta lembrar que os casos julgados por ele foram, na maioria, referendados pelas instâncias seguintes, como o Tribunal Regional Federal da 4ª Região e até o Superior Tribunal de Justiça. Quem resolveu encontrar atalhos foi o STF.

O que Moro não tem? O traquejo de político. E se isso o ajuda a se posicionar como um outsider, uma figura alheia ao universo atual de Brasília, é também um obstáculo do ponto de vista prático. O ex-juiz não tem o dom de encantar as massas. Moro, embora qualificado, não é um orador de primeira linha. Alguns podem argumentar que Dilma Rousseff também tinha sérias dificuldades neste sentido, ou que isso pode ser resolvido com uma dose pesada de preparação e media training. Sim, mas algumas ferramentas são desenvolvidas somente com o tempo, com o ganho de estrada e experiência. E isso não se compra na esquina ou se resolve da noite para o dia.

Moro tem um nicho facilmente identificável a ser buscado. É a mesma fatia que buscam Eduardo Leite e João Doria Jr. É onde estão os eleitores que um dia votaram em Lula ou Dilma, mas também já confiaram o voto em tucanos ou em Jair Bolsonaro. Esperar que um petista nato (aquele um terço do eleitorado ou menos) vote no ex-juiz é uma ilusão. Para esta turma, Moro é um inimigo mortal, afinal, foi ele o sujeito que colocou atrás das grades o maior expoente petista – Lula. Entre os bolsonaristas mais ferrenhos, ele também conta com uma boa dose de antipatia. A forma como saiu do governo, disparando críticas contra o atual presidente, alimentou a insatisfação.

O maior desafio de Moro é romper a polarização Bolsonaro X Lula. A partir de agora a máquina eleitoral começa a girar em ritmo cada vez mais acelerado.


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