O perigo chinês

O perigo chinês

O grande risco é virarmos reféns de uma dívida impagável

Guilherme Baumhardt

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Lula foi à China e assinou 15 protocolos. Os chineses são parceiros comerciais importantes para o Brasil – o principal, depois de ultrapassarem os Estados Unidos. Isso não significa que o alinhamento deva ser absoluto. Pelo contrário. Há muito mais pontos em comum com nossos vizinhos do continente americano e europeus do que com os asiáticos. A paixão lulopetista por Xi Jinping, porém, pode nos arrastar para armadilhas.

Um exemplo é o empréstimo recebido pelo BNDES do seu irmão oriental. O valor não é assombroso (R$ 6,5 bilhões). O grande risco é virarmos reféns de uma dívida impagável, em um futuro distante. Não deixa de ser irônico: Lula passou anos berrando aos quatro ventos que livrou o Brasil do Fundo Monetário Internacional (graças à internalização da dívida), mas agora pode subjugar o país aos interesses do Partido Comunista Chinês. Entre adotar o receituário de austeridade do FMI e ficar devendo favores a Xi Jinping, o primeiro cenário é muito mais palatável.

Hoje vendemos muito para os chineses. E, também, compramos. O grau de competitividade deles atingiu uma nova fase. Há a vantagem de um parque industrial instalado, mas o baixo custo da mão de obra, um dos principais atrativos décadas atrás, não é mais o mesmo. Em 2020, a classe média chinesa somava 400 milhões de habitantes, praticamente duas vezes a população brasileira. É gente que come e vive bem e que, portanto, ganha bons salários.
O melhor caminho para o Brasil seria diversificar mercados. O agronegócio já entendeu a lição e trabalha firme para conquistar novas fronteiras. A Coreia do Sul está no radar. Pouco? Se as portas de Seul forem abertas como desejam os produtores brasileiros, o potencial de faturamento equivale ao que exportamos hoje para a Europa. E é esta a lição que fica para o governo brasileiro, que – ao que tudo indica – quer estreitar laços com a China para níveis que beiram a servidão. Não é bom agora. E pode ser muito pior no futuro.

Temos potencial para disputar os principais mercados do mundo, nas áreas em que temos excelência. Ninguém é bom em tudo (nem mesmo americanos, alemães, japoneses ou chineses), mas o Brasil já atingiu patamares de produtividade em setores que o colocam como protagonista global. Qual o caminho? Livrar-se das amarras que travam nosso desenvolvimento.

O agronegócio brasileiro durante muito tempo viveu sob a égide estatal, através de subsídios e outras ferramentas. Nos anos 1990 isso mudou. Doeu no início, mas, verdadeiramente livre, o produtor rural fez a lição de casa e hoje é exemplo para o mundo. A indústria já deu mostras de que pode concorrer em pé de igualdade com os concorrentes internacionais, mas enquanto reformas importantes não avançarem, ficaremos reféns de políticas protecionistas.

Um exemplo: alguém duvida da qualidade do vinho e do espumante produzidos no Rio Grande do Sul? Se somos capazes de fazer algo com padrão internacional, o que justifica restrições à importação? Há algo mais absurdo do que manter funcionários públicos concursados fiscalizando carros na fronteira com o Uruguai para contar garrafas dentro de um porta-malas? É ridículo. O leitor que já teve a oportunidade de viajar para fora do país sabe que não há alfândega em países desenvolvidos. A inspeção que é feita nas bagagens procura material ilícito, como armas e drogas, e não computadores letais, telefones radioativos ou perigosíssimas máquinas fotográficas.

Enquanto não fizermos reformas como a tributária e uma nova fase da trabalhista, não conseguiremos disputar com nossos concorrentes externos. Com isso, aumentam as chances de um populista como Lula amarrar nosso futuro ao dos chineses. E é deprimente ver, do ponto de vista econômico, a comunista China ser muito mais capitalista do que o democrático Brasil.


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