Que tal sermos tratados como adultos?

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A volta da discussão sobre bebidas nos estádios

Guilherme Baumhardt

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Há alguns dias, o repórter Giovani Gafforelli, da Rádio Guaíba, mergulhou na polêmica que envolve a venda e o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol no Rio Grande do Sul. Ele mexeu no vespeiro. Leio agora no Correio do Povo que o assunto volta ao debate onde ele deve ocorrer: na Assembleia Legislativa, junto aos deputados estaduais. A proibição existe desde 2008. Ou seja, temos quase uma década e meia de uma legislação vigente, tempo mais do que suficiente para saber se ela produziu os efeitos esperados ou não.

Para surpresa de ninguém, não há dados consistentes a respeito do assunto. Existem opiniões e percepções, mas estudos de caso, que tenham mergulhado a fundo no tema, nada. A Brigada Militar é contra. A promotoria do torcedor é favorável. Os torcedores se dividem quando o assunto é a retomada da venda e consumo de álcool dentro dos estádios.

Beber faz parte do processo de socialização. Não é obrigatório, não é condição sine qua non para que a diversão seja garantida. Mas é um hábito socialmente aceito. Quando saímos do trabalho para um happy hour, além da batata frita, está na mesa também uma cerveja, um chope ou uma caipirinha. Quando convidamos amigos para jantar na nossa casa é comum que junto da lasanha ou da carne assada seja oferecida uma garrafa de vinho. Na Alemanha é comum beber, por exemplo, nas salas de cinema. Aliás, na Alemanha, qualquer lugar é um bom lugar para se instalar um biergarten, beber chopp e iniciar uma prosa.

Nos estádios de futebol não é diferente. Não é obrigatório, nem todos bebem, mas alguns gostam de acompanhar o seu time de futebol consumindo algum tipo de bebida alcoólica. E o que ocorre hoje? Como sempre, a vida real bate à porta com aquilo que somente míopes que não usam óculos teimam em não ver. Como é vedado o consumo dentro dos estádios, a turma confraterniza do lado de fora. E bebe. E, sim, alguns exageram. Quais os impactos disso?

O primeiro deles: a entrada no estádio é concentrada nos minutos finais que antecedem o começo do jogo. Como há uma aglomeração de torcedores afoitos, a própria revista da Brigada Militar é, muitas vezes, feita às pressas. Outro aspecto importante: o valor cobrado dentro do estádio é, quase sempre, maior do que aquele vendido fora. Se é mais caro, bebe-se menos, em menor quantidade. Se do lado de fora é mais barato, o consumo é maior.

Há ainda um argumento favorável à venda de bebidas dentro dos estádios que me parece irrefutável: é muito melhor e mais fácil identificar aqueles que exageram quando estes estão em um ambiente controlado e monitorado por câmeras. E é aí que mora o principal ponto do imbróglio. A discussão, para mim, vai muito além do simples debate sobre beber ou não beber. É sobre responsabilidade e sobre ser responsabilizado por, eventualmente, ultrapassar a linha.

Aquele que não tem condições de tomar cerveja em um estádio sem que isso o transforme num sujeito incontrolável não deve frequentar esse tipo de espaço. Se ele desrespeitar a lei e os demais torcedores, deve ser banido. E, mais uma vez, o exemplo a ser copiado vem da Inglaterra, que conseguiu eliminar do ambiente do futebol os antigos hooligans.

Hoje, no país que viu bandidos mancharem estádios e ruas com sangue, o torcedor é incentivado a chegar antes no estádio, entrar mais cedo e, pasmem, encontrar promoções do tipo “compre uma, leve duas”. Sim, um convite a beber mais por menos. A diferença é que lá há punição, quem agride e briga simplesmente não volta. Liberar é o primeiro passo. Punir de verdade é o segundo. Que tal virarmos adultos e sermos tratados como tal?


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